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Em um show sofisticado, Interpol toca os dois primeiros álbuns com a elegância de sempre

Em um show sofisticado, Interpol toca os dois primeiros álbuns com a elegância de sempre

8 de junho de 2024


Crédito das fotos: Stephan Solon/Move Concerts

No cair da noite paulistana, que ostentava um clima de outono muito agradável, a Audio Club, situada no bairro da Barra Funda, zona oeste da capital, se transformou em um ambiente dos sonhos para os fãs do movimento indie rock do início dos anos 2000, que se reuniram ansiosos para ver uma das bandas mais icônicas e sofisticadas dessa cena: Interpol.

E foi nesta sexta-feira, 7 de junho, que o grupo americano aterrissou em São Paulo para apresentar o primeiro show de duas datas exclusivamente dedicado aos dois primeiros álbuns da carreira: ‘Turn on The Bright Lights’ de 2002 e ‘Antics’ de 2004. Nem o fã mais sonhador da banda imaginou que esse evento de celebração, com essas configurações de setlist, pudesse acontecer. E aconteceu, foi mágico!

Antes mesmo de a banda subir ao palco, era possível observar a presença de fãs mais jovens, mesclando-se com o público na faixa etária dos 40 anos, vestindo camisetas de bandas como Pulp, Arctic Monkeys, Strokes, Blur, Bauhaus, INXS e, em grande maioria, do Interpol. Enquanto isso, a trilha sonora pré-show nos brindou com nomes como “Choir Boy” e “Micachu & The Shapes”, em um manifesto de muito bom gosto, só para criar aquele clima.

Pontualmente, às 21h, com uma atmosfera soturna, Paul Banks (vocal/guitarra) e Daniel Kessler (guitarra), acompanhados dos músicos de apoio Chris Boome (baterista substituto de Sam Fogarino, integrante oficial que se recupera de uma cirurgia na coluna), Brandon Curtis (teclado) e Brad Truax (baixo), sobem ao palco tocando ‘Specialist’, b-side do álbum de estreia, numa versão elegante, soturna e cheia de camadas e ritmos.

Após esse aquecimento, ‘Say Hello to the Angels’ surge em meio a uma iluminação sombria, que contornava o corpo de cada integrante, tornando a apresentação ainda mais atmosférica, à altura dos dois primeiros álbuns.

Em ‘Obstacle 1’, tivemos uma interação calorosa do público, que cantou alto desde a primeira estrofe: “I wish I could eat the salt off of your lost and faded lips. We can cap the old times, make playing only logical harm.” A magia estava no ar e permaneceu até o fim da música, com palmas e gritos entusiasmados.

Eis que surgem os primeiros acordes de ‘NYC’, canção que narra a vida em Nova York e que alcançou o status de um hit incontestável. Vê-la ao vivo, dentro deste contexto de show, revela o quanto envelheceu bem. É realmente uma baita música!

‘Roland’ e ‘Hands Away’ vêm na sequência, fazendo o coração dos presentes pulsar mais forte. ‘Roland’, em particular, ressoa de forma selvagem, carnívora, voraz. E o público compreendeu isso, reagindo de forma equivalente. Enquanto ‘Hands Away’, sempre cadenciada, convida a todos para uma imersão na batida do baixo de Brad Truax, que, cá entre nós, é um espetáculo à parte. A maneira como ele “domina” o instrumento cria uma vida própria, totalmente independente, dentro de uma música tão robusta. É difícil até de explicar. É um show dentro do próprio show!

E essa “vida própria” ganha ainda mais importância em ‘Stella Was a Driver and She Was Always Down’, onde mais uma vez, Mr. Brad nos leva por caminhos inimagináveis (ele fez isso o show inteiro, tá!). É verdade que essa música é uma das mais belas da discografia da banda, mas especialmente hoje, ela soou diferente, provocando lágrimas no rosto de muitas pessoas. Sem dúvida, um dos grandes momentos do show!

A intimista ‘Leif Erikson’ e o hit dos hits ‘PDA’ encerram o primeiro ato do show com Daniel Kessler mostrando todo o seu domínio na guitarra, fazendo a energia que só eles proporcionam pulsar na pele. Até aqui, tudo foi executado com muita precisão, poucos movimentos e praticamente nenhuma conversa por parte da banda. Paul Banks, inclusive, permaneceu estático o tempo todo, usando óculos escuros, e quando falou algo foi para cumprimentar ou elogiar o público.

E aos que esperavam ouvir “Turn on The Bright Lights” na íntegra, podem ter se sentido frustrados. Além de não “respeitarem” a ordem original do disco, também ignoraram as faixas “Obstacle 2” e a belíssima “The New”. Senti falta? Sim, bastante! Mas tudo bem!

Aos gritos de “INTERPOL, INTERPOL, INTERPOL”, a banda retorna para o segundo ato, nos convidando a reviver o álbum ‘Antics’ na íntegra, do jeito que ele nasceu há 20 anos. E poder relembrar toda aquela sensação de ouvir o disco na ordem, rodando o CD no discman rua acima, rua abaixo, foi sensacional!

‘Next Exit’ e ‘Evil’ transformaram a Audio em um recital de voz única, com todos cantando em uma só voz, no volume máximo. Na sequência, foi a vez de ouvir ‘Narc’ e ‘Take You on a Cruise’, com aquele nó na garganta, como se estivéssemos todos no auge da adolescência. E sentir-se assim, sem se preocupar com o mundo lá fora, é muito raro; é muito confortante!

‘Slow Hands’ chega com aquela energia de punk selvagem, elevando o nível de euforia para além do visível. Enquanto ‘Not Even Jail’, ‘Public Pervert’ e ‘C’mere’ convidam o público a sofrer de forma sutil, sem deixar que o sangue escorra.

Já na parte final do show, com aquele clima de despedida pairando no ar, fomos agraciados com as densas ‘Length of Love’ e ‘Time to Be So Small’, que nos convidam a refletir sobre a vida no melhor estilo do post-punk clássico.

Enquanto a banda se retira do palco para o tradicional bis, ouve-se alguém dizer: “que show do baixista e sua banda”, destacando o baixista Brad Truax e seu estilo de tocar, sua afinação, ele por inteiro! E tenho que concordar com o colega de plateia. Que performance, realmente!

E por fim, ela: ‘Untitled’, a canção que carrega um peso melancólico único, trazendo o prenúncio de uma despedida emocionada, de um show que ficará marcado para sempre na história da banda e dos fãs.

Obrigado, Interpol! Voltem sempre, voltem logo!

Setlist:

Specialist
Say Hello to the Angels
Obstacle 1
NYC
Roland
Hands Away
Stella Was a Diver and She Was Always Down
Leif Erikson
PDA
Next Exit
Evil
Narc
Take You on a Cruise
Slow Hands
Not Even Jail
Public Pervert
C’mere
Length of Love
A Time to Be So Small
Untitled

Galeria do show