O trio Motorcavera disponibilizou seu novo trabalho on-line. O segundo álbum da banda, chamado Idiocracia, é composto por oito faixas de uma sonoridade que flerta com elementos de estilos diversos do rock. Já as letras são um reflexo dos novos tempos e do atual contexto político, social e cultural no qual estamos inseridos. Por ora, o disco foi liberado apenas no YouTube, mas poderá ser acessado n’outras plataformas (como Deezer, Spotfy e Bandcamp) em breve.
O show oficial de lançamento ocorre neste sábado (17/8), às 17h30min, na Casa Obscura (Rua Garibaldi, 776), em Porto Alegre. Mais informações sobre o evento neste link.
Sobre o álbum Idiocracia:
A Motorcavera segue rumo por uma trip ruidosa, intensa e cheia de reflexões sobre os tempos de hoje. Em Idiocracia (2019), segundo álbum oficial de uma trajetória constante — de ritmos acelerados e outros nem tanto —, o trio radicado em Porto Alegre chega abastecido de um rockão sujo aditivado pelo uso de pedais. Poderia ser só música. Mas na real é combustível para insatisfeitos. Em aproximadamente 27 minutos, a banda apresenta uma reação barulhenta, debochada e questionadora ante o cenário sócio-político-cultural distópico que nos cerca atualmente.
“O disco tem relação direta com a situação política e social do momento. É reflexo da confusão causada numa geração alimentada pelos aplicativos e smartphones. Gente que se expressa, funciona e vive por meio de algoritmos que nos fazem perder a capacidade cognitiva. Esses dispositivos servem para inflar egos e jogar as pessoas umas contra as outras, nos fazendo desviar de preocupações mais importantes”, pontua Eddi Maicon, responsável pelas composições.
Se a lírica é contemporânea, a base sonora vem de referências mais abrangentes na cronologia linear da existência. O que se ouve em Idiocracia é uma edição (in)consciente de elementos distintos, porém convergentes, do rock como forma de expressão — e de contestação. A impetuosidade e a urgência dos anos 1960 (que vieram a descambar no punk), o experimentalismo com groove dos 1970, o flerte com traquitanas eletrônicas popularizado nos 1980 (synth e midi) e a simplicidade inventiva que marcou os 1990 permeiam as oito faixas do trabalho. Ao contrário do que possa parecer, esse resgate não soa anacrônico. Apenas mostra que na arte, assim como na vida, pensar o presente sem esquecer o passado aponta para um futuro com menos possibilidade de retrocessos.
E quem não sabe de onde vem dificilmente vai ter noção do lugar em que quer chegar. Nesse contexto, olhar para si de maneira crítica é o ponto de partida em Idiocracia. Já o de chegada depende das inclinações pessoais de quem ouve. “Eu não quero ir pra onde tudo faz sentido”, diz a primeira frase de ‘Corpoporco’, que abre o disco no gás com uma batida repetitiva e contagiante. ‘Estrago’ continua no embalo, impaciente, brincando com jogo de palavras que lembra Titãs da fase Arnaldo Antunes.
‘Penso’ desacelera o pique e mergulha numa vibe space garageira. Já ‘Sopa de Granada’ retoma o tom bombástico com batida tupa-tupa e quebras de andamento em meio a uma base frenética. A sequência traz a faixa-título — primeira do registro a ganhar videoclipe —, com baixo pulsante, riff tenso e efeito maroto para acomodar uma letra bem sacada e cheia de ironias.
‘Orobobos’ recupera a tendência viajandona da Motorcavera, com letra minimalista, desatinos e linha de guitarra pegajosa conduzindo graves bem marcados — rola até virada sabbhatica. ‘Tela Azul’ começa sem excessos, mas irrompe em explosões guiadas por um riff hipnotizante e um convite à reflexão. ‘Introlerância’ tem participação da vocalista Julia Barth (Os Replicantes) para fechar o disco em clima punkão, no som e na letra (“também pode dar um murro na cara de fascista/também pode dar um tapa na orelha de racista”).
Escrito e composto no fim de semana em que as urnas anunciaram o Messias como presidente do Brasil, em outubro de 2018, e gravado ao vivo em dezembro do mesmo ano num galpão, em um bairro não tão central da capital gaúcha, Idiocracia revela a sintonia entre Eddi (guitarra e vocal), Diego Neves (bateria) e Guilherme Walau (baixo) após mais de uma década em conjunto. Da concepção à gravação, passando pela produção e outros processos que envolvem o lançamento de uma obra fonográfica — ainda que disponibilizada somente na internet —, o trampo foi todo no esquema faça você mesmo. Tudo, literalmente, tocado adiante pelos próprios músicos. Nada diferente do álbum Desmonte (2017) e dos EPs I (2012) e Pedra Redonda (2015).
Idiocracia, ao passo que cativa, perturba. Ou o contrário. Cada um que saiba de que lado está.