*Com informações fornecidas pelo Ministério Público do Trabalho
Uma operação realizada por procuradores do Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro (MPT-RJ) e auditores-fiscais da Superintendência Regional do Trabalho resultou no resgate de 14 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão durante o Rock in Rio 2024. O resgate ocorreu no último dia 22 de setembro, após a força-tarefa identificar irregularidades graves nas condições de trabalho e alojamento de funcionários contratados para a montagem e limpeza de estruturas do evento.
As autoridades responsáveis pelo caso forneceram mais detalhes em uma coletiva de imprensa, realizada hoje, dia 18 de dezembro de 2024, na sede do MPT-RJ, no Centro do Rio de Janeiro.
As vítimas, contratadas pela empresa FBC Backstage Eventos Ltda., relataram jornadas exaustivas de até 21 horas seguidas, com pausas de apenas três horas antes de retomar o trabalho. Apesar da promessa de diárias entre R$ 90 e R$ 150, os valores não foram integralmente pagos.
Durante a operação, fiscais encontraram os trabalhadores dormindo em condições precárias no escritório da empresa, instalado na Arena de Tênis do Parque Olímpico, dentro do festival. Eles se deitavam sobre papelões, sacos plásticos e lonas. Banhos eram improvisados em banheiros femininos ou no vestiário esportivo do local, que apresentava condições de higiene inadequadas, incluindo urina no chão e roupas espalhadas. “No momento em que encontramos os trabalhadores dormindo precariamente sobre lonas e papelões foi difícil acordá-los para as entrevistas, tamanho era o cansaço deles” , destacou Raul Capparelli, auditor-fiscal do Trabalho.
A ação concluiu que as condições degradantes de alojamento, jornadas exaustivas e trabalho forçado caracterizaram trabalho análogo à escravidão. Foram lavrados 21 autos de infração contra a FBC Backstage e outros 11 contra a Rock World S.A., organizadora do evento, responsabilizada por negligenciar a fiscalização do cumprimento das normas trabalhistas.
Apesar das irregularidades, as empresas se recusaram a firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MPT. Agora, medidas judiciais serão adotadas para garantir a indenização individual e coletiva às vítimas e evitar novos casos.
O MPT também requisitou esclarecimentos da entidade que certificou o festival como “sustentável” e cobrou providências das marcas apoiadoras do evento, alertando para o risco de associação de suas imagens ao uso de trabalho escravo.
Não é a primeira vez que o Rock in Rio se envolve em denúncias de trabalho análogo à escravidão. Em 2013, 93 trabalhadores de uma empresa de fast-food foram resgatados em condições similares, com jornadas exaustivas e alojamentos precários. Já na edição de 2015, 17 trabalhadores também foram resgatados em circunstâncias degradantes.
Para o procurador do Trabalho Thiago Gurjão, responsável pelo inquérito, a repetição dos casos é alarmante. “Não é possível tolerar trabalhadores nas condições que foram encontradas, dormindo em papelões por três horas antes de voltar para uma nova jornada de um trabalho pesado, carregando materiais, por até 20 horas. É inadmissível que isso ocorra em um evento de grande porte, com um discurso voltado para a sustentabilidade e responsabilidade social, que tem todos os recursos necessários para que isso não ocorra”, afirmou.
O caso traz à tona a necessidade de maior fiscalização e responsabilidade por parte dos organizadores de eventos de grande porte para garantir condições dignas de trabalho a todos os envolvidos.