Em 26 de outubro de 1992, o Kreator lançava “Renewal“, o álbum de número seis da discografia deste lindo quarteto alemão, cuja maior virtude é não apoiar fascistas nem governantes autoritários. O mais novo trintão da cena é tema do nosso Memory Remains desta quarta-feira.
A banda vinha de dois excelentes álbuns: “Extreme Aggression” (1989), considerado como um dos melhores álbuns de todos os tempos do Thrash Metal alemão, e o não menos excelente “Coma of Souls” (1990), onde eles apostavam em canções mais complexas. Para o aniversariante do dia, eles prepararam surpresas ainda maiores: o Kreator apresentava uma sonoridade mais moderna, apostando no Groove e no industrial.
Por mais que o fã não aceite, há uma explicação para essa mudança e não era apenas o Kreator que se via na obrigação de apresentar novas alternativas. O Metal de maneira geral passava por uma crise de identidade e perdia espaço para as bandas de Rock Alternativo e para o movimento Grunge. O Metallica apostou em uma sonoridade mais comercial, o Megadeth idem, o Anthrax abandonou o Thrash Metal vigoroso, até mesmo o Iron Maiden que perdia Bruce Dickinson para a carreira solo, sentiu o baque. Com o Kreator não foi diferente e eles buscaram uma saída. Pode não ter sido a melhor, mas eles tentaram e a tentativa foi muito válida.
Então a banda se reuniu com o produtor Tom Morris, que tem em seu currículo trabalhos com Savatage, Kamelot, Morbid Angel e também havia feito a mixagem do álbum “Beneath the Remains“, do Sepultura, e todos atravessaram o Atlântico rumo ao icônico Morrisound Studios, em Tampa, Flórida, por onde ficaram trancafiados entre os meses de agosto e setembro de 1992 para gravar o vindouro álbum. Vamos então, como de costume, passear pelas nove faixas contidas aqui.
E ao colocar a bolacha para rolar, a gente já percebe a diferença no som do Kreator, logo nas primeiras batidas de Ventor, que introduz com sua bateria a faixa de abertura, “Winter Martyrium“. A faixa vai se desenvolvendo entre partes rápidas e partes com mais Groove. Não é ruim, mas estranha e muito ao ouvinte que vai esperar palhetadas rápidas do Thrash Metal que os alemães fizeram por quase toda sua carreira, à exceção dos anos 1990. A faixa título vem a seguir, e traz bons riffs, porém, nada de Thrash Metal. As influências aqui são o Metal industrial. Mas a canção é muito boa, só o vocal de Mille Petrozza que soa bastante esquisito.
“Reflection“, a faixa número três, é ainda mais experimental, onde os caras apresentam riffs crus, peso e um certo clima denso, em seis minutos de duração, a mais longa do play, mas não a única a ter esse tempo. “Brainseed” é um crossover interessante e Ventor com sua bateria mais parece estar tocando em uma banda de Hardcore. Os riffs desta música são bons. “Karmic Wheel” é a outra faixa que ultrapassa os seis minutos de duração e temos alguns elementos distintos nesta música, mas o que prevalece é o clima denso que temos por aqui. O grande destaque é o riff de guitarra do refrão, muito bom.
Metade do álbum já se passou e agora temos “Retalitätskontrolle” uma intro que se resume a barulhos desconexos, que nos faz achar que os caras gravaram isso depois de estarem bem chapados de algum tipo de ácido. Mas para nossa felicidade, essa faixa dura pouco mais de um minuto e depois somos agraciados com a melhor faixa do play: “Zero to None“, que é um baita Metal com toques industriais que nos faz lembrar do Fear Factory, só que com uma pegada mais suja.
Estamos chegando nas duas faixas finais de “Renewal” e temos a número oito, que atende pelo nome de “Europe After the Rain“, que é outra faixa onde a banda embarca no crossover. “Depression Unrest” tem riffs simples, mas pesados e que soam bem. Muitas vezes o simples é o melhor a se fazer. E desta forma, o Kreator deixa a sua marca, em pouco mais de 38 minutos de muita novidade no som e honestidade.
Longe de ser o melhor álbum do Kreator e também longe de ser o pior, “Renewal” divide opiniões. Há quem o ame, há quem o odeie. O álbum fez com que alguns fãs deixassem de acompanhar a banda. Outros acusaram a banda de estar sem criatividade, após lançarem seis álbuns em oito anos. Foi na turnê deste álbum que o Kreator veio pela primeira vez em terras brasileiras, o que depois seria uma coisa corriqueira, rendendo inclusive a gravação de um DVD, anos depois, o “Live Kreation“. Nesta primeira visita ao país, a banda tocou no extinto Programa Livre, comandado por Serginho Groisman, no SBT. Bons tempos em que a gente podia ver boas bandas de Rock e Metal tocando na TV aberta, durante o dia. Quem tem mais de 35 anos vai entender e concordar com este redator que vos escreve.
Após a turnê, o baixista Rob Fioretti deixou a banda para se dedicar a família e logo depois, o baterista Ventor tambem abandonou o barco, deixando Mille Petrozza como único membro original. Ventor ficaria de fora do disco posterior, “Cause for Conflict“, mas iria retornar no álbum “Outcast” (1997), e permanece fiel ao companheiro até os dias de hoje.
A fase experimental ficou para trás, o Kreator voltou a praticar seu Thrash Metal e segue como uma das maiores bandas alemãs do estilo. Felizmente eles passaram pela pandemia sem danos e acabaram de nos presentear com o ótimo “Hate Über Alles“, que certamente estará entre os melhores lançamentos de 2022. Assim sendo, hoje é dia de celebrarmos o mais novo trintão do Heavy Metal e desejamos longa vida para estes antifas maravilhosos. O Rock e o Metal precisa de mais bandas como o Kreator.
Renewal – Kreator
Data de lançamento – 26/10/1992
Gravadora – Noise Records
Faixas:
01 – Winter Martyrium
02 – Renewal
03 – Reflection
04 – Brainseed
05 – Karmic Wheel
06 – Retalitätskontrolle
07 – Zero to None
08 – Europe After the Rain
09 – Depression Unrest
Formação:
Mille Petrozza – vocal/ guitarra
Frank Gosdzik – guitarra
Rob Fioretti – baixo
Ventor – bateria