1992 foi um ano muito bom para a música pesada. Diversos álbuns que se tornaram clássicos foram lançados naquele ano e em 2022 entraram para o grupo dos “trintões”. O Megadeth, que recentemente lançou o maravilhoso single “We’ll be Back“, também lançou o seu disco icônico em 1992. E o nosso Memory Remains desta quinta-feira vai tratar de “Countdown to Extinction“, o disco de número cinco da banda de Dave Mustaine, lançado em 14 de julho.
É bem verdade que o Megadeth recentemente decepcionou por demais os fãs brasileiros, ao cancelar pela segunda vez seguida a sua participação no Rock in Rio. Em 2019 foi por um motivo de força maior, pois Dave Mustaine foi diagnosticado com câncer e a banda precisou parar as atividades, inclusive a produção do novo álbum, que acabou ficando para este ano. Mas o cancelamento do show na noite de abertura do RIR de 2022, optando em ser banda de abertura do Five Finger Death Punch é algo inaceitável para uma banda do porte do Megadeth. Tudo bem, no mundo capitalista, o dinheiro vale mais, claro e tem também o fato de Dave ser antivax e isso certamente inviabilizaria sua aterrissagem em terras brasileiras, pois apesar de termos um presidente claramente contrário à ciência e defensor de teorias conspiratórias, temos instituições que lutam pela democracia e assim sendo, é exigida a comprovação de vacina para entrada no país. Assim sendo, nós perdoamos o Dave e vamos usar do eufemismo para qualificá-lo como um sujeito excêntrico, pois com a guitarra nas mãos ele é muito melhor do que como pessoa e sua música há de ser exaltada.
Countdown to Extinction. Lançado um ano após o “Black Álbum” do Metallica, algumas pessoas comparam os álbuns, que são bem diferentes entre si, sendo que se a banda anterior de Dave Mustaine explodiu comercialmente, o Megadeth, guardadas as proporções, teve seu êxito comercial. Claro que não se tornou a enormidade e a fábrica de ganhar dinheiro que a banda de James Hetfield e Lars Ulrich se tornou, mas a “tirada de pé” que a banda deu neste álbum os fizeram alcançar um outro patamar, e, consequentemente, ganhou mais público.
“Countdown…” não deixa de ser Heavy Metal, apenas não é tão rápido quanto quanto seus antecessores, “Rust In Peace” e “So Far, So Good…SoWhat!“, mas é um excelente disco, onde a velocidade dá lugar ao peso, as melodias e a criatividade das composições. Este é considerado por muitos como sendo o melhor álbum da banda.
Com a formação estabilizada, o que acontecia pela primeira vez em quase dez anos de existência, e respaldado pelo sucesso do álbum anterior, que resultou em turnê que inclusive, deu aos fãs brasileiros a oportunidade de ver a banda pela primeira vez ao vivo, no Rock In Rio II, em 1991, no estádio do Maracanã. Esta apresentação, inclusive, foi lembrada por Dave Mustaine, quando da abertura do show do Black Sabbath, em 2013, na Praça da Apoteose (arrepiando este que vos escreve e que lá estava presente). Ele só errou o ano da apresentação: não foi em 1992, Musta. Mas nós vamos relevar essa escorregada dele.
Richard Avedon /Capitol Records
Com 47 minutos de duração e produção de Max Norman e Dave Mustaine, o disco, que foi gravado entre janeiro e abril de 1992, teve mais de 7 milhões de cópias vendidas (em tempos que não havia downloads, o máximo que poderíamos fazer era esperar aquele amigo comprar o álbum e então iríamos com uma mísera fitinha cassete para poder gravar e escutar no walkman – quem tem mais de 40 anos como este que vos escreve, sabe bem o que é isso) e ganhou dois discos de platina somente nos EUA. O estúdio usado pela banda foi o “The Enterprise Studio”, na Califórnia, por onde eles ficaram entre os dias 6 de janeiro e 28 de abril daquele ano de 1992.
“Countdown” foi lançado pela antiga gravadora da banda, a Capitol (sim, aquela em que, no último lançamento contratual da banda – uma coletânea – Mustaine batizaria o lançamento de “Punição da Capitol”, em tradução livre) e alcançou o 2º lugar da Billboard, uma façanha e tanto para uma banda de Heavy Metal, sobretudo numa época em que o grunge estava em alta na terra do Tio Sam e que muito tentou-se propagar a ideia de que o estilo estava morto. Mas NÃO ESTAVA MESMO.
Vamos passear pelas onze faixas dessa bela bolacha. Temos a excelente “Skin O My Teeth” abrindo, com um peso fantástico, a bateria estupenda de Nick Menza anunciando o novo play da banda, riffs bem rápidos se considerarmos o restante das faixas. A letra trata das tentativas de suicídio de Mustaine e é um dos destaques desta obra.
A faixa número dois é certamente a música mais famosa da banda, presença certa nas apresentações e já virou clichê os gritos dos fãs imitando os riffs da guitarra base cantando “Megadeth, Megadeth”., esta é “Symphony Of Destruction“. A letra conta a história de um cidadão comum como chefe de um regime fantoche. O ruim é que quando a banda toca esta música, a tristeza toma conta de todos, pois depois que ela é executada, sabemos que “Peace Sells”e “Holy Wars…” anunciam o término da apresentação, há anos tem sido assim. Fantástica canção. Anos mais tarde, o Arch Enemy fez uma versão para essa música e ficou bastante engraçada a bela Angela Gossow cantando.
Na sequência temos “Architecture Of Aggression“, uma música mais arrastada, com riffs bem interessantes, e letra que Mustaine revelou ter sido escrita para o ex-ditador iraquiano Saddam Hussein, na época da composição do álbum o mundo via a dissolução do regime soviético, que iria culminar com o fim da Guerra Fria, e em contrapartida, o mundo encarava com incredulidade a Guerra do Golfo.
“Foreclosure Of A Dream” é a faixa número quatro, num ritmo mais cadenciado, bem melódica, com um solo fantástico e a letra, inteligentíssima, tratando da desigualdade social. Seu videoclipe foi veiculado à exaustão na MTV, figurando por diversas vezes no Top 20 da emissora e o caro leitor poderá assistir abaixo.
“Sweating Bullets” dá sequência ao álbum em um estilo invador em termos de Megadeth: a música é cantada em estilo de conversação e a letra trata da batalha travada com o “eu interior” de Dave Mustaine. Uma música densa, pesada e que é presença certa nas apresentações da banda, cantada em uníssono por todos que ali estejam presentes. O grande destaque desta música é a presença da cozinha, o ponto alto desta canção, belo trabalho de Nick Menza e Dave Ellefson.
“This Was My Life” é a faixa número seis e uma música em que os riffs bem produzidos mesclados com muita melodia ditam as regras, com letra que trata de uma pessoa já em fim da sua vida fazendo uma retrospectiva do que se passou ao longo dos anos. Uma das minhas favoritas deste álbum.
A segunda metade da bolacha traz a faixa título e fala sobre caçadores inescrupulosos de animais (Ted Nugent não gostaria deste comentário) que matam e os mandam para empalhadores transformá-los em troféus. É uma faixa que pessoalmente não me agrada muito, não que ela seja ruim, não é, trata-se apenas de preferência, é muito melódica e é bem executada pelo quarteto. O título foi sugestão de Nick Menza ao ler um artigo na revista Time com o título de “The Countdown To Extinction” (contagem regressiva para a extinção, em tradução livre).
A faixa seguinte com certeza é uma das minhas favoritas deste play: “High Speed Dirt“, que fala sobre paraquedismo. High Speed Dirt é uma expressão usada quando o pára-quedas não abre. A música é fantástica, mais rápida do que as demais, e novamente os riffs da dupla Mustaine e Friedman nos fazem viajar. E aquele solinho meio blues no final? Que coisa fantástica é aquela. Fantástica como a música toda. “Psycothron” é a música número 9 e talvez seja a música mais pesada de todo o álbum, com as guitarras fazendo o trabalho com maestria. A letra trata da invenção de um ser metade robô, metade humano assassino.
“Captive Honour” anuncia que o álbum está chegando ao fim com uma melodia triste, porém, não menos densa e pesada como todas as músicas anteriores, onde mais uma vez a dupla de guitarristas pôs a prova toda a sua capacidade de criação e execução. A letra trata o dia a dia de um prisioneiro, em um estilo vocal de Dave quase que conversando com seus ouvintes, o que combina muito bem com a parte instrumental, dando uma harmonia quase perfeita entre peso e melodia.
“Ashes In Your Mouth” traz o final da audição em uma música é ainda mais rápida do que “Skin O My Teeth” e “High Speed Dirt“, mas não sem deixar o peso de lado. É uma canção tão intensa que os seus seis minutos parecem durar metade do tempo, tamanha a complexidade na execução desta, cuja letra trata do sonho de liberdade e sucesso, típicos do estadunidense e que por vezes, mostra que as pessoas sentem-se tristes depois que chegam ao ponto alto de suas vidas. Bela canção e assim como a bateria vigorosa de Nick Menza abre o disco, ele repete o excelente trabalho nos segundos finais da pequena bolacha (ou do seu vinil).
“Countdown To Extinction” foi indicado ao prêmio de “Melhor desempenho de Metal” no “Grammy Awards” de 1993 e a faixa título ganhou a “Humane Society’s Genesis Award”, um prêmio que reconhece artistas que de alguma forma contribuem para a melhoria da sociedade humana, sendo a única banda de Heavy Metal a ser agraciada com tal honraria. E cá entre nós, poderia uma letra tão inteligente e que nos faz pensar em respeitar a vida, poderia não vencer este prêmio?
O aniversariante do dia foi o primeiro álbum sem contar com a mascote Vic Rattlehead na capa, que só voltaria a aparecer em “The World Needs a Hero”, em 2001. Como dito lá no início do texto, o aniversariante de hoje alcançou a 2ª posição na “Billboard”, o melhor desempenho de um disco do Megadeth.
Eu, particularmente tenho uma relação muito intensa com este álbum: na minha lista de preferências, ele fica em quarto lugar, atrás de “Rust In Peace“, “Peace Sells” e até mesmo do “Endgame“. Tive a oportunidade de viajar do Rio de Janeiro até São Paulo para assistir, no dia 06/09/2012, na extinta casa Via Funchal, o primeiro show do Megadeth da minha vida e este simplesmente teve entre os clássicos da banda, a execução na íntegra deste álbum. Não era com a formação clássica, mas tinha um virtuoso Chris Broderick fazendo um excelente trabalho e Shawn Drover que, se não era tão brilhante quanto Nick Menza, deu conta do recado com seu feijão-com-arroz. Uma apresentação que me fez valer a pena ter passado mais tempo dentro do ônibus indo e voltando pela deliciosa Via Dutra do que, propriamente, dentro da terra da garoa. Uma história tão louca que quase me fez perder o ônibus que partiria daqui do Rio, por culpa do trânsito caótico da cidade do Rio e do meu péssimo planejamento de logística, que incluía um amigo que viajaria comigo contando com meu conhecimento da cidade paulistana e que me relatou já dentro do ônibus, depois do susto que passei para chegar na rodoviária faltando cinco minutos para o embarque, que não embarcaria caso eu não chegasse. Todos esses perrengues me fizeram valorizar ainda mais a apresentação, e o mais importante, a amar ainda mais esta bolacha, que hoje ainda permanece atual, tanto na parte lírica quanto na parte musical.
Hoje então é dia de desfrutar e celebrar este estupendo álbum, com certeza um dos mais importantes da década de 1990 e também dos mais emblemáticos da carreira do Megadeth. Estamos aguardando o novo play da banda, cujo lançamento será dia 2 de setembro. E desejamos uma longa vida a banda do “chatão” Dave Mustaine.
Countdown to Extinction – Megadeth
Data de lançamento – 14/07/1992
Gravadora – Capitol
Faixas:
01 – Skin O’ My Teeth
02 – Symphony of Destruction
03 – Architecture of Aggression
04 – Foreclosure of a Dream
05 – Sweating Bullets
06 – This Was My Life
07 – Countdow to Extinction
08 – High Speed Dirt
09 – Psychotron
10 – Captive Honour
11 – Ashes in Your Mouth
Formação:
Dave Mustaine – Vocal / Guitarra
Dave Ellefson – Baixo
Marty Friedman – Guitarra
Nick Menza – Bateria