1988 foi um ano sensacional para a música pesada. Diversos lançamentos que se tornaram históricos completam 35 anos em 2023. Um deles é “From Enslevament to Obliteration“, segundo play da banda, lançado pelo Napalm Death em 16 de agosto daquele ano. O álbum que ajudou o quarteto britânico a se tornar um gigante do Grindcore é assunto do nosso Memory Remains deste sábado.
A banda vinha do seu aclamado álbum de estreia, “Scum“, que havia sido gravado em diferentes períodos com formações diferentes. O aniversariante do dia é o último álbum a contar com as participações do vocalista Lee Dorrian e do guitarrista Bill Steer, que iria se dedicar exclusivamente ao Carcass. “From Enslevament to Obliteration” marca também uma estreia: a do baixista Shane Embury, que é o membro mais antigo do Napalm Death hoje em dia. É bom lembrar que a banda já não possui nenhum membro original.
O nome do play é o mesmo de uma demo lançada em 1986, antes mesmo de “Scum“. Entretanto, nenhuma música entrou neste play, visto que a maioria delas está no álbum de estreia. Na época, a banda lançou o disco de maneira independente e acabou logo depois, quando eles assinaram com a Earache. Outra curiosidade é que as onze primeiras músicas, que no vinil pertencem ao lado A, foram concebidas em um primeiro momento para serem lançadas em um split com a banda de hardcore australiana Atavistic.
O baixista Shane Embury certa vez relembrou o processo de gravação e a evolução sonora da banda, em entrevista para a revista Keerang!. Aspas para ele:
“Foi uma boa experiência, mas foi breve. Naquela época, os álbuns eram gravados muito rapidamente – gravamos o álbum em cerca de seis dias e acho que custou cerca de £ 800. Nos primeiros dias, antes de eu entrar, era mais uma banda crust punk, mas foi uma progressão natural, eu acho, para ficar cada vez mais rápido. Scum criou um burburinho e quando fizemos FETO, só queríamos levá-lo o mais longe possível e o mais rápido possível. Nós não estávamos realmente tentando quebrar nenhuma regra conscientemente, mas também não estávamos prestando atenção nelas. Se quiséssemos fazer uma música que tivesse 20 segundos de duração, então faríamos – não achamos que houvesse motivo para não fazê-lo. Os vocais para nós foram de mãos dadas com o baixo distorcido, guitarras distorcidas e bateria hiper-rápida”.
Um destaque especial para as letras, já que desde os primórdios o Napalm Death levantou a bandeira para as causas sociais: temas como misoginia e sexismo foram abordadas em “It’s M.A.N.S. World” e “Inconceinvable?“; os direitos aos animais e o materialismo vieram a tona com “Display to me” e “Private Death“, racismo em “Unchallenged Hate” e na faixa título. Eles também descem a lenha (com total razão) em “Make Away!” e pedem uma mudança social em “Uncertainty Blurs the Vision“, com direito a uma citação para a banda britânica anarco-punk Rudimentary Peni ao final desta última. Enfim, temas que o headbanger brasileiro vê com desdém e prefere acreditar no discurso repleto de preconceituoso dessa turma que esteve no poder e fez com que o país regredisse o equivalente a trinta anos em apenas quatro.
Em julho de 1988, a banda adentrou ao Birdsong Studios, em Birmingham, tendo na produção Digby Pearson, ou simplesmente Dig. A banda atuou na co-produção. Se no álbum anterior são 28 músicas em assustadores 33 minutos, aqui temos 22 músicas em menos de meia hora. À exceção da faixa de abertura, “Envolved as One“, todas as demais é o mais puro Grindcore, para poucos ouvidos.
O álbum foi bem recebido pelos críticos e aclamado como um dos maiores clássicos do Grindcore de todos os tempos. A Loudwire o classificou em 10° lugar na lista dos melhores álbuns de Metal do ano de 1988. Já a “Rolling Stone” colocou o play na posição 59 na lista dos 100 maiores álbuns de Metal de todos os tempos. Além disso, o álbum alcançou a 1ª posição nas paradas britânicas, na categoria “Indie albuns”, um grande feito para uma banda tão extrema quanto o Napalm Death.
Uma curiosidade é que em alguns exemplares do Vinil, existe um adesivo colado com uma frase atribuída ao vocalista do Def Leppard, Joe Elliot, que diz assim: “Nós queremos ser a maior banda do mundo e você não faz isso soando como o Napalm Death“. Eles usaram isso de maneira sarcástica e ficou sensacional. A verdade é que o Napalm Death soando desta forma tornou-se a maior referência do Grindcore mundial e isso não é pouco.
Existe também uma versão dupla em vinil deste álbum que consiste mas faixas originais lançadas no disco 1 e mais cinco faixas do EP “The Curse“, no segundo disco, são elas “The Curse“, “Musclehead“, “Your Achivement?“, “Dead” e “Morbid Deceiver” (esta uma regravação da música “Deceiver“, lançada no álbum anterior). Essa versão dupla foi lançada em 1989 no Brasil pela Rock Brigade Records, selo que uma década depois se tornou um dos principais em terras tupiniquins.
Hoje é dia de celebrar esse tesouro do Metal extremo. É uma dádiva poder testemunhar bandas que realmente entenderam a essência do Rock, que é contestar as coisas erradas da nossa sociedade e lutar por justiça no campo social. O Napalm Death nos orgulha tanto pelo som quanto pela sua militância. Felizmente a banda segue na atividade plena e quem esteve no Summer Breeze Brasil este ano pôde comprovar a letalidade dos caras ao vivo, com direito a um “Fuck Bolsonaro”, proferido pelo vocalista Mark “Barney” Greenway. Assim nós desejamos longa vida a este quarteto maravilhoso. Escutemos esse play no volume máximo.
From Enslevament to Obliteration – Napalm Death
Data de lançamento – 16/09/1988
Gravadora – Earache
Faixas:
01 – Envolved as One
02 – It’s a M.A.N.S. World!
03 – Lucid Fairytale
04 – Private Death
05 – Impressions
06 – Unchallenged Hate
07 – Uncertainty Blurs the Vision
08 – Cock-Rock Allienation
09 – Retreat to Nowhere
10 – Think for a Minute
11 – Display to me
12 – From Enslevament to Obliteration
13 – Blind to the Truth
14 – Social Sterility
15 – Emotional Suffocation
16 – Practice What You Preach
17 – Inconceinvable?
18 – Worlds Apart
19 – Obstinate Direction
20 – Mentally Murdered
21 – Sometimes
22 – Make Away!
Formação:
Lee Dorrian – vocal
Bill Steer – guitarra
Shane Embury – baixo
Mick Harris – bateria