Há exatos 25 anos, em 25 de janeiro de 1999, o Nevermore lançava aquele que é considerado a sua obra prima: “Dreaming Neon Black” é o terceiro álbum da discografia dessa saudosa banda de Seattle e que é tema do nosso Memory Remains desta quinta-feira, dia de TBT. Vamos contar um pouco da história deste belíssimo álbum.
E se no primeiro disco, a banda ainda apresentava latentes características do antigo Sanctuary e no segundo disco, os caras já começavam a formar o embrião da sonoridade simplesmente impossível de se rotular, neste disco, ai é que o ouvinte apegado às ramificações, fica mais confuso, no bom sentido da palavra. A banda começava a moldar o seu som aqui. E um som único, inimitável.
Voltando um pouco no tempo, a banda estava colhendo os frutos do excelente disco antecessor, “The Politics of Ecstasy“, que incluiu uma tour sendo banda de abertura do Death. Os caras precisavam se superar. Então o imortal Warrel Dane trouxe um conceito para o disco, cujas letras tratariam da lenta decadência de um homem ao perder a sua namorada. O homem da história é o próprio Warrel, cuja namorada, de nome Patricia Candace Walsh morreu após entrar para uma seita que pregava o uso de drogas pesadas. Ele tinha pesadelos, nos quais a moça clamava seu nome enquanto sucumbia afogada, e isso explica as duas versões da capa do disco, em uma delas, um corpo feminino boiando, já sem vida e na outra versão, uma mulher submersa na água, com uma das mãos para fora, esperando ajuda. A arte da capa, assinada pelo parceiro de longa data, a fera chamada Travis Smith.
Segundo a Wikipedia, a história de que Patricia morreu após entrar para tal seita não é real. Ela parece ter sido assassinada juntamente com o marido, Douglas Zyskowski, por um serial killer chamado Robert Bem Rhoads, em janeiro de 1990, enquanto pegava carona em destino a uma oficina religiosa na região de Utah e parece que o frontman do Nevemore não sabia da história ou preferiu romantizá-la para contar a história aqui em “Dreaming Neon Black“, nunca saberemos. E fazendo uma breve pesquisa no Google, é fácil de obter informações sobre uma mulher de nome Patricia Candice Walsh, assassinada em 19 de janeiro de 1990. É, caro leitor, se você que é fã de Nevermore está estupefato com essa informação, saiba que este redator está se sentindo igual ou até pior. Verdade ou não, e parece que é, eu ainda prefiro a história que inspirou o álbum, é mais romântica e visceral.
Vamos voltar a parte musical, a banda, reforçada com mais um guitarrista, Tim Calvert (1965-2018), entrou no “Village Productions“, em Tornillo, Texas, novamente com Neil Kermon na produção e o resultado foi um disco forte, denso, desesperador e a performance vocal de Warrel foi simplesmente de emocionar qualquer ouvinte. O álbum teve também a participação especial da cantora Christine Rhoades, que com seu talento, abrilhantou a faixa título.
Em uma conversa com os integrantes da banda brasileira que acompanhou os anos finais da carreira do frontman e que gravaram o excelente disco póstumo, “Shadow Work“, o guitarrista Thiago Oliveira me relatou que o próprio Warrel lhe confidenciou que considerava em “Dreaming Neon Black” a sua obra prima enquanto vocalista e também considerava o melhor disco que ele já havia gravado. Enquanto intérprete, ele foi magnífico neste play, pois mesmo essa história não tendo acontecido com nenhum conhecido do ouvinte, é possível sentir toda a angústia, o desespero e o sentimento de que você não terá de volta aquela pessoa a quem amava. A sensação é de que a história se passou com alguém bem próximo do ouvinte.
E colocando a bolacha para rolar, temos uma viagem que dura uma hora e cinco minutos, divididas em treze faixas, uma mais destruidora do que a outra. A começar pela intro “Ophidian“, que teve as falas contidas retiradas do filme “Lord of Illusions“, escrito e dirigido pelo diretor Clive Barker, em 1995. Difícil escolher uma única faixa que se destaque, pois temos canções poderosas como “Beyond Within“, “I am the Dog“, “The Death of Passion“, “Poison Godmachine“, que intercalam perfeitamente com músicas mais desesperadoras como “Deconstruction“, “Dreaming Neon Black“, “No More Will“, “Forever” e a belíssima “The Lotus Eaters“. É um disco que serviu como um perfeito interlúdio para a obra definitiva da banda que veio depois, “Dead Heart in a Dead World“.
Deixe a bolachinha rodar por por alguns minutos e entra a faixa escondida (bem, nem tão escondida assim, já que ela é anunciada na contracapa do disco) “Optmist or Pessimist“, que na época em que baixei o disco, eu não conhecia, mas quem conhece, sabe que ela é a faixa que abre o EP “In Memory” (1995). Uma canção Thrash Metal, com a cara do Nevermore, ou seja, moderna. Trata-se da mesma versão usada no lançamento original, sem retoques, sem regravação. Excelente canção.
Aí as gravadoras que distribuíram o disco no Brasil (Rock Brigade Records e Laser Company) cometeram um erro inaceitável: eles anunciaram como bônus a música “In Memory“, como sendo a faixa #15, porém, a mesma simplesmente não está no CD. Na época eu fiquei bastante frustrado, pois queria conhecer esta música. Precisei comprar anos depois, o EP homônimo para poder conferir.
Uma outra curiosidade que os rapazes da banda solo de Warrel me contaram também é sobre um anel que eles encontraram entre os pertences dele, quando juntavam tudo para enviar à sua irmã. E este anel, nas palavras deles, era como se fosse um anel de noivado, provavelmente ele teria usado com esta moça. Nunca saberemos. Fato é que ele carregava consigo esse anel onde quer que ele fosse.
Hoje não temos mais esse gênio chamado Warrel Dane entre nós. Ele perdeu a batalha para o Diabetes, essa doença asquerosa, que mata aos poucos. E Jeff Loomis teve a sábia decisão de enterrar qualquer possibilidade de um retorno do Nevermore sem seu vocalista. Loomis era de vital importância para a banda, bem como Van Williams e Jim Sheppard, mas, Warrel Dane era o coração. Suas letras inteligentes, seu carisma, sua interpretação, sua presença de palco fizeram dele um dos únicos vocalistas de sua geração. O Nevermore sem Warrel Dane é um barco sem leme, uma rua sem saída, é algo impensável.
Temos um disco absurdamente maravilhoso, pesado, denso, com uma história pesada, mas emocionante. E mesmo com ¼ de século depois de seu lançamento, permanece atual. Envelhece bem e merece muito ser comemorado. Longa vida ao “Dreaming Neon Black“, que fechou muito bem o trabalho do Metal nos idos dos 1900. Vamos celebrar a existência desse disco, que completa 25 anos de maneira tão sensacional quanto ele era naquele 25 de janeiro de 1999, quando a banda abalou as estruturas da cena, ajudando a calar a boca daqueles que insistiam que o Heavy Metal estava morto. O quinteto de Seattle mostrava que não e ainda emergia para se tornar uma das mais importantes do cenário naquela altura. Se Warrel estivesse entre nós, estaria falando sobre as causas sociais, para desespero daqueles que ainda insistem que Rock e conservadorismo devem andar juntos.
Dreaming Neon Black – Nevermore
Data de lançamento: 25/01/1999
Gravadora: Century Media
Faixas:
01 – Ophidian (intro)
02 – Beyond Within
03 – The Death of Passion
04 – I am the Dog
05 – Dreaming Neon Black
06 – Deconstruction
07 – The Fault of Flesh
08 – The Lotus Eaters
09 – Poison Godmachine
10 – All Play Dead
11 – Cenotaph
12 – No More Will
13 – Forever
14 – Optimist or Pessimist (faixa bônus escondida)
Formação:
Warrel Dane – Vocal
Jeff Loomis – Guitarra
Tim Calvert – Guitarra
Jim Sheppard – Baixo
Van Williams – Bateria
Participação especial:
Christine Rhoads – Vocal adicional em “Dreaming Neon Black“