Em 1989, muito antes de explodir, a cena grunge de Seattle já existia e era tão forte quanto a cena Metal. Porém, restrita ao underground. Soundgarden, Screaming Trees, Mudhoney já estavam fazendo seu som, o Pearl Jam ainda não existia, mas Stone Gossard e Jeff Ament tocavam juntos no Mother Love Bone, cujo vocalista Andrew Wood iria morrer vítima de overdose, e o Nirvana que nem sonhava em se tornar o gigante que é mesmo quase três décadas depois de seu prematuro final, lançava “Bleach“, seu álbum de estreia no dia 16 de junho e que é tema do nosso Memory Remains desta quarta-feira.
O trio, à época sem o baterista Dave Grohl havia gravado um compacto no ano anterior, chamado “Love Buzz” , que é uma versão para a música do mesmo nome do cantor Robbie Van Leewen, lançado originalmente em 1969. O compacto do Nirvana tinha apenas uma música de cada lado: a já citada versão e “Big Cheese”. Para os mais novos, um compacto era um disco de vinil, porém, menor ao que estamos acostumados, e um pouco maior do que os CD’s. Tinha capacidade para poucas músicas e funcionava como os atuais EP’s.
Logo após este lançamento, a banda passou a ensaiar para gravar o aniversariante de hoje, mas a Sub-Pop, gravadora da banda, queria um EP, pois não dispunha de recursos para lançar um álbum completo. Mas os caras foram lá e gravaram as músicas, em uma sessão de 5 horas no “Reciprocal Recording”, em Seattle, no dia 24 de desembro de 1988. Ainda aconteceram mais duas sessões de gravação, uma entre os dias 29 e 31 de dezembro e mais outra sessão entre os dias 14 e 24 de janeiro de 1989.
Seattle sempre foi uma cidade em que várias bandas, seja do Rock ou do Metal emergiram. De lá saíram Queensryche, Metal Church, Sanctuary dentre as mais pesadas, e no Rock Alternativo, já tínhamos também uma cena forte, com as bandas já citadas no início deste texto. Então, por isso, a “Sub-Pop” fazia pressão para que as bandas de seu cast tocassem Rock, coisa que o Nirvana não se opôs. E o trio batia o pé para que o selo lançasse álbum com todas as músicas gravadas e não somente um Extended Play.
A gravadora, por sua vez, adiou o lançamento do disco, por falta de verba e finalmente, cinco meses após o término das sessões de gravação, o álbum foi lançado no formato em Vinil, com uma triagem limitada de 1000 cópias. Jack Endino (lembra deste nome, caro leitor? Então, é o cara que veio o Brasil 4 anos depois para produzir o poderoso “Titanomaquia”, além de outros álbuns dos Titãs) assinou a produção da obra e recebeu por isso a quantia de US$ 617 e foi financiada por um guitarrista chamado Jason Everman. O cara ficou impressionado com uma demo do trio que chegou às suas mãos. A banda retribuiu creditando-o como um dos guitarristas, embora ele não tenha tocado em nenhuma faixa deste play.
O álbum conta com o trabalho de dois bateristas: Dale Crover, do Melvins e Chad Channing, que substituiu o primeiro e concluiu o que seu antecessor havia iniciado. A sonoridade de “Bleach”, de acordo com uma entrevista do baixista Krist Novoselic, fora influenciada por uma fita em que eles colocaram para rolar. Na tal fita, de um lado tinham músicas da banda The Smithereens e do outro lado, o Metal extremo do Celtic Frost. E não são raros os trechos do disco em que podemos perceber a influência da banda de Tom G. Warrior. Que algumas bandas de Metal beberam nesta fonte, não chega a ser surpresa, mas alguns podem ficar embasbacados com a informação de que uma banda de Metal Extremo tenha servido como inspiração para o Nirvana.
Vamos colocar a bolacha para rolar e destrinchar cada uma das faixas do aniversariante do dia. O redator está com a versão em CD, que possui duas faixas a mais: “Big Cheese” e “Downer”. Então vamos lá:
“Blew”, a faixa de abertura é pesada, suja e descompromissada, enquanto que “Floyd the Barber” é relativamente pesada e lembra muito as faixas de “Incesticide“, aquele disco de raridades que a banda lançou entre “Nevermind” e “In Utero”. “About a Girl” é um dos pontos altos deste play, embora ela tenha ficado mais conhecida quando do lançamento do acústico da MTV. E a versão acústica ficou bem melhor, porém, vale a pena escutar a versão original, que é boa.
“School” é bem chatinha, sem peso algum, mas logo chega uma faixa bem legal, uma das melhores: A já famosa “Love Buzz”, com os repetidos riffs de baixo de Krist Novoselic e todo aquele clima psicodélico. “Paper Cuts” é outra pertencente ao grupo das chatinhas deste play e “Negative Creep” tem bons riffs, embora o timbre da guitarra seja demasiadamente sujo. Ainda assim é uma música mediana.
“Scoff” é uma faixa razoável com sua pegada post-punk. E “Swap Meet” traz guitarras mais sujas e uma pegada punk e um solo pra lá de descompromissado. Aliás, cá entre nós, Kurt Cobain nunca foi nem sequer um guitarrista regular, logo não podemos exigir que ele seja ótimo solista. “Mr. Moustache” é outro destaque deste play, uma música com bastante energia, interessante. “Sifting” tem até riffs pesados em um som denso e até certo ponto, sombrio. Boa música.
As faixas bônus, “Big Cheese” é bem deprê, como muitas músicas do Nirvana, mas aqui cabe até um grooveado no refrão e “Downer” entrou como bônus e já era conhecida, pois foi lançada antes no disco “Incesticide“. E essa música é fantástica, com seu punch bem punk, que era a tendência da proposta musical da banda de Kurt Cobain.
Em 45 minutos de audição, se não temos um primor musical como vimos nos álbuns posteriores, trata-se do pontapé inicial da banda que viria a revolucionar o Rock nos anos 1990 e cuja fama, Kurt Cobain não saberia lidar, vindo a suicidar-se, em abril de 1994.
“Bleach” teve uma vendagem relativamente boa, e é o disco da “Sub-Pop” que mais vendeu: a explosão de vendas aconteceu quando a banda alcançou o topo com seu sucessor, “Nevermind”. E todos foram conferir o tal primeiro álbum da banda. Se antes o disco tinha vendido 40 mil cópias só nos Estados Unidos, com o relançamento em 1992, fez o álbum alcançar a 89ª posição na “Billboard”, a 33ª posição no Reino Unido, 34º na Austrália e 24º na Finlândia. A morte de Cobain deu outra alavancada nas vendas do álbum, fazendo ele figurar na 6ª posição da lista “Top Pop Catalog”, da “Billboard”, e posteriormente, chegando ao primeiro lugar.
Em 2009, “Bleach” foi relançado com um CD bônus, contendo uma apresentação ao vivo da banda em 1990 e chegou ao 7º lugar na “Billboard Catalog Albuns”. Recebeu disco de platina em 1995, vendeu quase 2 milhões de cópias nos Estados Unidos e foi certificado com disco de ouro no Canadá.
Um disco recomendado para quem curte um som alternativo, com guitarras sujas e por vezes psicodélicas. O leitor pode até não gostar do Nirvana, mas não podemos deixar de reconhecer a importância da banda no início dos anos 1990. Foram eles quem colocaram o Rock de volta em evidência, já que naquela época, as bandas, principalmente as de Metal, sofriam com problemas de criatividade e o Rock Alternativo manteve o estilo em evidência. Celebremos o álbum que lançou o maior trio da década de 1990 na cena.
Bleach – Nirvana
Data de lançamento – 15/06/1989
Gravadora: Sub-Pop
Faixas:
01 – Blew
02 – Floyd the Barber
03 – About a Girl
04 – School
05 – Love Buzz
06 – Paper Cuts
07 – Negative Creep
08 – Scoff
09 – Swap Meet
10 – Mr. Moustache
11 – Sifiting
12 – Big Cheese
13 – Downer
Formação:
Kurt Cobain – Vocal/Guitarra
Krist Novoselic – Baixo
Chad Channing – Bateria
Dave Crover – Bateria em “Floyd the Barber”, “Paper Cuts” e “Downer”