Em 19 de outubro de 1993, o PEARL JAM lançava o seu segundo disco. E esse é um marco, não só para a história da banda, mas também a história do Rock dos anos 1990 e crucial na vida deste redator que vos escreve.
A banda havia crescido de forma inimaginável: “Ten“, o disco de estreia, bateu recordes de venda; a turnê foi gigantesca, porém, a banda não estava sabendo lidar com todo o sucesso em torno de si. Havia pressão da “Epic” para que a banda produzisse uma nova “galinha dos ovos de ouro”.
O processo de gravação não foi dos mais tranquilos, a começar pelo nome do álbum, que em princípio, seria “Five Against one” (Cinco contra Um, em tradução literal), nome trocado por questões óbvias, apesar de que, o ouvinte que prestar atenção nos primeiros versos da faixa “Animal“, perceberá que a frase se faz presente e não há nada de pervertido aqui.
A banda passou por dois estúdios, entre março e maio de 1993. O início dos registros se deu no “Potatohead Studio“, na cidade de Seattle, com uma mudança para o estúdio “The Site”, que fica em um sítio na cidade de Nicasio, na Califórnia. Quando da chegada no último local, o baterista Dave Abbruzzese deu ao local de gravação o adjetivo de “tranquilo”, enquanto que o frontman Eddie Vedder soltou a seguinte pérola:
“Eu odeio isso aqui. Eu tive um momento difícil. Como você faz um disco de Rock aqui?”
O guitarrista Mike McCreaddy deu uma entrevista em 2002 lembrou dos tempos difíceis:
“A banda explodiu e logo éramos muito grandes, era tudo muito louco.”
Os caras optaram em dar menos ênfase comercial e focar apenas na música, mas tudo isso teve efeito contrário: “VS.” foi cercado de muita expectativa e superou o antecessor em termos de vendas: bateu o recorde de mais cópias vendidas em sua primeira semana de lançamento (950 mil cópias), além de ter ocupado a primeira posição da “Billboard 200″ por cinco semanas, sendo assim, o álbum do PEARL JAM que ficou nesta posição durante o maior tempo.
Naquela época, qualquer banda que tentasse se autossabotar, como fez o PEARL JAM, com certeza sucumbiria. Mas eles tinham cara e coragem. Enfrentaram a MTV, deixaram de dar entrevistas e o segundo disco foi o boom que foi.
A produção ficou a cargo de Brendan O’Brien, que confessou recentemente ter sentido a necessidade de deixar os caras mais à vontade para gravar e tirar a pressão dos fãs, gravadora e de toda a indústria musical. E a saída para tal foi incentivar aos caras a praticarem softball todas as manhãs.
E a sonoridade da banda em muito se distanciou do que escutamos em “Ten“, sendo mais raivoso, embora em alguns momentos com melodia e até batidas tribais, como iremos ver a seguir, destrinchando cada faixa da bolacha:
Temos a abertura sensacional com três faixas poderosas: “Go” que é composta de forma bem simples; duas estrofes, refrão entre elas, solo e o final com o refrão que a esse momento já é bem grudento: “Please, don’t go on me“. É uma música pesada e com guitarras sujas, muito boa.
Animal” muito provavelmente seja a música que tenha o melhor riff de guitarras da carreira do PEARL JAM, em que aqui há um flerte com o Heavy Metal. Sim, apenas um breve flerte, mas que ficou sensacional e deixa neste redator um sentimento de como era bom aquele PEARL JAM pesado, novo, arredio.
“Daughter” já é bem diferente das duas canções anteriores e traz um PEARL JAM mais suave, com boas linhas melódicas de Eddie Vedder, a levada swingada de Abbruzzese no seu kit de bateria e um solo bem interessante. Foi a primeira música deste álbum lançada aqui no Brasil e ela toca até os dias de hoje nas poucas “rádios rock” que ainda sobrevivem.
“Glorified G” é uma crítica aos que insistem em ter porte de armas, e parece bem pertinente para um certo país da América do Sul que elegeu um louco que pretende armar a população, sob a alegação de que o “cidadão de bem” precisa andar armado. Na verdade, a letra foi escrita para o baterista Dave Abbruzzese, que havia adquirido uma arma recentemente. Musicalmente, ela é um Hard Rock até interessante, mas não tão poderosa quanto as três primeiras.
Mas o nível volta a subir com a excelente “Dissident“, uma música ainda Hard, com linhas de guitarras bem melódicas, sem deixar de ser pesadas. E outra vez brilha a performance de Eddie Vedder.
Em “W.M.A.”, o esboço do que se tornaria o PEARL JAM: uma música bem experimental, com batidas tribais e boas passagens do baixista Jeff Ament, A letra, mais uma vez ácida, critica os policiais estadunidenses (N. do R: aqui no Brasil as coisas não são tão diferentes).
Reprodução
Se você está no vinil, é hora de virar o disco. Como o redator que vos escreve está relatando a experiência da fita cassete que ele cita embaixo, na sua bio, vamos sem virar lado algum e a faixa sete traz a raivosa “Blood“, com influências punks e um final excelente, com as batidas de Dave Abbruzzese e as guitarras da dupla Stone Gossard e Mike McCreaddy.
“Rearviewmirror” é uma das melhores canções da carreira da banda, um Hard Rock sensacional, épica, gigante, indispensável. É música ideal para que você escute em uma auto-estrada, sem limite de velocidade. “Rats” é uma das minhas preferidas deste play, com um Jeff Ament inspiradíssimo em seu baixo na intro e depois dando espaço para que Eddie Vedder brilhe no restante da música com seu carisma e talento vocal. E o final ficou épico com a música abaixando o volume enquanto se encerra…
Ai temos uma balada, com um nome gigantesco: “Ederly Woman Behind the Counter in a Small Town” é acústica, bonitinha, em que a suave voz de Vedder toma conta de nós.
Um pouco mais de raiva é posto a prova na penúltima faixa: “Leash” uma música com guitarras distorcidas e um refrão sem igual, onde Vedder grita “Drop the Leash/Drop the Leash/ Oh Get Outta my fucking face” (N. do R.: algo como “largue a corrente/largue a corrente/saia da minha frente, porra). Lembro me que a primeira publicação de Rock e Heavy Metal que comprei na minha vida foi uma revista chamada “Top Rock“, isso no ano de 1994, em que o PEARL JAM era capa e ali era a última entrevista que a banda faria em muitos anos. E um dos temas da conversa era exatamente o refrão desta música, em que Eddie afirmava que recebeu uma carta de uma fã acusando a banda de racismo por estes versos. Seja lá onde for que essa fã enxergou preconceito, a música em si é ótima. E apesar de eu adorar o disco posterior e ainda escutar a banda pelo menos até o álbum “Riot Act” (2002), aqui era a última vez que escutávamos um PEARL JAM sendo raiz.
O final do disco se dá com a tranquila e melancólica “Indifference“, que seria uma “declaração” de Eddie para a sua então esposa, Beth, com quem ele foi casado por muito tempo. Aqui temos o baixo de Jeff Ament trabalhando muito, uma batidinha de Abbruzzese e vez por outra, aparições das guitarras de Gossard e Mccreaddy, mas sem distorções. Enquanto Eddie Vedder alterna tons no seu vocal em uma interpretação muito boa.
Temos em pouco mais de 46 minutos, um disco bem honesto, em que pese o fato de o caro leitor gostar ou não de PEARL JAM, mas precisamos admitir que esse disco tem importância em uma época que o Rock sofria de crise de existência e até mesmo de identidade, com poucas bandas fazendo a diferença no cenário.
“VS.” teve como singles as músicas “Go“, “Daughter“, “Animal” e “Dissident“, todas ficaram em primeiro lugar nas paradas Mainstream Rock e Modern Rock, por um total de oito semanas. Em 1995, “Daughter” foi nomeada na categoria “Melhor performance de Rock por um duo ou vocalista”; “Go” recebeu a nomeação de “Melhor Performance de Hard Rock” e “VS.”recebeu nomeação na categoria “Melhor Álbum de Rock”. Nada mal.
Para este redator, “VS.” tem uma importância ainda mais vital: eu citei no primeiro parágrafo, mas só quis dissertar sobre isto aqui no final e foi de maneira bem proposital. Não é segredo para ninguém que me acompanha aqui que este álbum mudou a minha vida, desde que peguei emprestado aquela fitinha de 90 minutos com a menina da qual eu era muito afim e não passamos os limites da amizade, que do lado B tinha a gravação do “Chaos A.D,“, do SEPULTURA, que depois de ter a curiosidade aguçada, me fez mergulhar no mundo do Heavy Metal. Mas algum dia eu teria de devolver a fita para a moça e assim eu o fiz. Um dia, porém, lá nos idos de 1995, eu achei uma nota de R$50 em uma rua do bairro de Icaraí, em Niterói e lembro-me exatamente do que eu fiz: comprei um lanche em um fast-food e comprei o “VS.”. E ainda sobrou troco. Eram outros tempos em que “cinquenta contos” valiam algo.
Era o primeiro disco de Rock que eu comprava na minha vida e por isso eu guardo essa lembrança com tanto carinho. É impossível não misturar o lado analítico com o pessoal quando escrevo estas linhas. Este disco ajudou a formar-me com homem, como cidadão, como fã de Rock, e porque não dizer, como redator deste site? Talvez eu não seria um colaborador da HEADBANGERS NEWS não fosse por essa obra. De verdade.
O PEARL JAM já não é mais a mesma banda dos anos 1990 e eu honestamente adoraria que a banda deixasse de tentar soar como PINK FLOYD, YES ou THE WHO, pois foi por aparições como esta aqui em “VS.” que esta banda de Seattle foi a minha “teenage band“. E saudosista que sou, irem sempre me lembrar com carinho e escutar este álbum, que representa muito na minha vida. Ainda que hoje eu escute músicas mais extremas em comparação ao PEARL JAM.
VS. – Pearl Jam
Data de lançamento – 19/10/1993
Gravadora – Sony Music
Faixas:
01 – Go
02 – Animal
03 – Daughter
04 – Glorifield G
05 – Dissident
06 – WMA
07 – Blood
08 – Rearviewmirror
09 – Rats
10 – Ederly Woman Behind the Counter in a Small Town
11 – Leash
12 – Indifference
Formação:
Eddie Vedder – Vocal
Stone Gossard – Guitarra
Jeff Amentm – Baixo
Mike McCreaddy – Guitarra
Dave Abbruzzese – Bateria