Memory Remains

Memory Remains: Ramones – 45 anos de “Rocket to Russia” e o sarro que a banda tirou com a guerra fria

4 de novembro de 2022

Em 4 de novembro de 1977, o Ramones lançava seu terceiro álbum de estúdio. “Rocket to Russia” é assunto do nosso Memory Remains desta sexta-feira. Vamos contar um pouco da história deste play dos reis do Punk Rock.

A banda havia lançado o disco anterior, “Leave Home” haviam apenas dez meses. E entre agosto e setembro daquele ano de 1977, eles entraram no Mediasound para gravar o aniversariante do dia. Duas faixas, “I Don’t Care” e “Sheena is a Punk Rocker” foram gravadas em abril, no Sundragon. Ambos os estúdios se localizam em Nova Iorque e ouvindo a bolacha a gente consegue identificar as diferenças entre essas duas faixas e as demais. A produção ficou a cargo de Tony Bongiovi e Tommy Ramone. Aliás, este foi o último álbum que Tommy tocou com a banda, pois a partir daqui, ele se dedicou a carreira de produtor musical. Ed Stasium também colaborou na produção da bolacha.

O título do álbum é considerado uma tiração de sarro com a guerra fria, período de disputas ideológicas, territoriais e econômicas entre os Estados Unidos e a então União Soviética. Eles sempre se ameaçavam, sem jamais entrarem em conflito bélico. Ainda bem, não é mesmo? O título pode ser considerado uma piada com as ameaças de ataque nucleares trocadas entre os dois países.

Em 1977, a cena punk de Nova Iorque estava em alta. Os clubes recebiam as bandas locais e sempre lotavam. Em especial a famosa CBGB. Os fãs do estilo acreditavam que era questão de tempo para o Punk Rock estar em evidência na cena musical. O autor Tom Carson deu um panorama sobre o movimento Punk estadunidense naquele período: aspas para ele.

“Estar em Nova York no verão de 1977 era como estar em São Francisco em 1966 ou 67, ou em Londres quando os Beatles e os Rolling Stones estouraram”.

Sobre a música “Sheena is a Punk Rocker“, uma curiosidade: ela havia sido lançada como single no verão do hemisfério norte e acabou entrando no álbum “Leave Home” em substituição a faixa “Carbona Not Glue“, pois a banda foi processada pela empresa de limpeza chamada CARBONA. Então oficialmente, a música saiu aqui em “Rocket to Russia” e é uma das mais famosas canções da banda.

O selo Sire Records injetou uma quantia que girava entre US$ 25.000 e 30.000 para as gravações do álbum, uma quantia que superou a verba que a banda dispunha nos álbuns anteriores. O aluguel do estúdio custava US$ 150,00/ hora. Eles usavam o primeiro take das gravações como o material que seria utilizado no álbum. Johnny Ramone explicou certa vez a tática:

“É melhor gravar rapidamente … Se o engenheiro de som disser que ficou bom, então passamos para o próximo take. Você não quer sentar lá e fazer besteira. É o seu dinheiro que estão gastando.”

Uma coincidência durante as gravações era que no estúdio havia uma funcionária chamada Ramona, mas ela não tem nenhuma relação com a música homônima lançada neste play. A canção foi escrita muito tempo antes. Aliás, a pobre moça foi vítima do machismo que já imperava naqueles tempos. Ela foi convidada a se retirar do seu próprio ambiente de trabalho, pois Johnny Ramone era contra a presença de mulheres no estúdio enquanto a banda estivesse por lá. Vai entender…

A capa frontal mostra uma foto da banda e na parte traseira temos um desenho anti-comunista, onde a mascote da banda aparece montado em um míssil balístico partindo dos Estados Unidos rumo à Moscou. Na mesma gravura, temos imagens do Capitólio, a Catedral de São Basílio, em Moscou, Fidel Castro e até mesmo um rastafari jamaicano. A arte foi feita pelo artista John Holmstron, que cobrou US$ 1.000 para entregar o desenho.

Em relação às músicas, temos 14 faixas em apenas 31 minutos. Alguns dos maiores clássicos dos Ramones saíram deste “Rocket to Russia“: “Cretin Hop” (uma ode da banda aos seus fãs), “Rockway Beach” (inspirada na banda Beach Boys), as já citadas “I Don’t Care” e “Sheena is a Punk Rocker“, “We’re a Happy Family“, “Teenage Lobotomy“, “I Wanna be Well ” e “Ramona” (que vinte anos mais tarde ganhou uma versão dos Raimundos, chamada “Pequena Raimunda“). O álbum é o primeiro da banda a contar com covers: “Do You Wanna Dance“, de Bobby Freeman e “Surfin’ Bird“, da banda The Thrashman. Musicalmente, a banda trafega entre o Punk Rock e a Surf Music.

O álbum foi bem recebido pela crítica e hoje é considerado como um dos trabalhos mais icônicos não só do Ramones, mas do Punk Rock de maneira geral. As vendas foram bem baixas e é consenso que a culpa está do outro lado do Atlântico, pois os Sex Pistols emergia na cena londrina e seu visual e atitudes afastaram as pessoas do estilo, que passou a ser visto com desdém pelas pessoas. Joey Ramone falou certa vez sobre o assunto:

“Todo mundo mudou de opinião, e depois disso as coisas mudaram radicalmente. Eles realmente estragaram as coisas para a gente. Os Ramones se transformaram em objeto de medo. “Eu me lembro que os jornalistas tinham medo de nos entrevistar e serem espancados. Algumas rádios pensavam isto também. Não fazia o menor sentido”.

Ainda assim, o álbum esteve presente em alguns charts pelo mundo: 11° na Finlândia, 31° na Suécia, 36° no Canadá, 49° na “Billboard 200”, 60° no Reino Unido e 79° na Austrália. No ano de 3003, a revista Rolling Stone o classificou na 106ª posição na sua lista dos 500 Melhores Álbuns de Todos os Tempos. Sem dúvidas, é uma referência do Punk Rock e um álbum que ficará eternizado.

Hoje não temos mais a banda em ação, mas fica a lembrança de quem fazia o simples de maneira que ficou marcado no Rock and Roll. O Ramones é uma instituição que merece ser tombada pelo patrimônio histórico. Se tivesse sido lançado antes de a NASA enviar as sondas Voyager I e II, certamente este álbum estaria vagando pelo espaço interestelar até hoje, a procura de vida inteligente em outra galáxia. Sortudos seriam os extraterrestres que encontrassem essa pérola do Punk Rock. Hoje é dia de celebrar esse play, então vamos escutá-lo no talo.