Há 29 anos, em 20 de fevereiro de 1996, o Sepultura lançava “Roots“, o sexto e mais bem sucedido álbum da maior banda brasileira de todos os tempos e que é assunto do nosso Memory Remains desta quinta-feira.
A iniciativa da banda era inovadora para alguns e considerada uma “papagaiada'” pela parcela mais radical dos fãs. Tudo porque Max Cavalera teve a ideia de incluir elementos da música brasileira e convenceu a banda a passar alguns dias junto à tribo Xavante. Carlinhos Brown foi o escolhido para incorporar a musicalidade brasileira ao Groove Metal.
Além disso, diversos outros músicos participaram como convidados: Mike Patton (Faith no More), Jonathan Davis (Korn), DJ Lethal, David Silveria, colaboraram de alguma forma nas gravações, que rolaram no Indigo Ranch, em Malibu, entre os meses de outubro e dezembro de 1995, tendo a produção assinada por Ross Robinson e a mixagem por Andy Wallace.
Apesar da boa fase vivida pela banda, o clima interno era bem tenso. Max Cavalera afirmou em sua autobiografia “My Bloody Roots“, que rolou um certo ciúme por parte dos outros integrantes, devido ao fato de ele, um ano antes ter gravado o projeto Nailbomb, em companhia de Alex Newport. Segundo o vocalista/ guitarrista, os outros membros entendiam que algumas músicas do projeto poderiam facilmente fazer parte do novo play do Sepultura. A relação foi azedando até que o ano de 1996 terminou com o fundador abandonando a própria banda.
“Roots” é apontado também como o marco zero do New Metal, ainda que não haja unanimidade, mas é indiscutível que o estilo acabou virando uma verdadeira tendência depois que os brasileiros lançaram o play. Talvez a maior influência do álbum seja outra banda que futuramente também se tornaria grande e que hoje tem um baterista que já tocou no próprio Sepultura: estamos falando do Slipknot.
Na parte lírica, o álbum aborda temas que seguem atuais, quase 30 anos depois: guerras (“Endangered Species“), a preocupação com a Amazônia (“Ambush“), o antifascismo, anos antes de surgirem fascistas defensores de ditadura militar (“Dictatorshit“), além de colaborações de Carlinhos Brown em “Ratamahatta“, de Dana Wells, em “Attidude” e dos Xavantes, em “Ítsari“. O líder indígena Cipassé falou certa vez sobre a experiência em receber a banda em sua aldeia. Aspas para ele:
“Foi um choque cultural para os dois lados. Mas foi tudo muito tranquilo, bom para todas as partes, porque todos deram o coração e se empenharam para fazer daquela uma boa experiência. Eles nos falaram que tinham esse sonho, de gravar com os índios e queriam uma música que fosse bonita e forte. Mostramos nossas músicas de cura. Mostramos uma, que ouviram várias vezes e não gostaram. Na segunda, sentiram que podiam fazer um arranjo, colocar um ritmo legal e foi assim que gravamos.”
“Roots” tem dezessete músicas, em sua versão brasileira (eles incluíram duas faixas bônus: “Procreation (of the Wicked)”, do Celtic Frost e “Symphton of The Universe“, do Black Sabbath). É um álbum que deve ser ouvido com atenção e o ouvinte precisa se despreocupar com o Thrash Metal que eles praticavam até o álbum “Arise“. Em alguns momentos, soa experimental demais, mas traz canções que se tornaram hinos da banda, como “Roots Bloody Roots“, “Attitude“, a já citada “Ratamahatta“, “Spit“, “Born Stubborn” e a raivosa “Dictatorshit“.
A recepção foi ótima, tanto por parte da crítica especializada, como por parte do público e também por diversos músicos. Dave Grohl, que inclusive escreveu o prefácio da autobiografia de Max Cavalera, disse que, a época, ele queimou um amplificador quando colocou o álbum para escutar e pôs no volume máximo. É comum vê-lo em entrevistas dizendo que o Sepultura é sua banda brasileira favorita.
“Roots” é o álbum mais vendido da história do Sepultura e quando Max deu a ideia para o CEO da Roadrunner da época, Monte Conner, ele escutou a resposta do executivo de que misturar Heavy Metal com música indígena seria um suicídio comercial. A história mostra que Max estava certo. O álbum frequentou diversas paradas de sucesso pelo mundo: 2° na Áustria, 3° na Austrália e na Bélgica, 4° no Reino Unido, 5° na Finlândia e na Suécia, 6° nos Países Baixos, 7° na Alemanha, 8° na Noruega e Nova Zelândia, 16° na Suiça e 27° na “Billboard 200“.
A turnê rodou os quatro cantos do planeta. Eles tocaram no Ozzfest e também em Donnington Park, mas houve um episódio bem desagradável, quando o enteado de Max, Dana Wells foi assassinado e ele e Glória voltaram às pressas para os Estados Unidos, com Ozzy emprestando o jatinho para possibilitar a viagem. Na ocasião, o Sepultura se apresentou como um trio. Este foi um dos episódios que foram decisivos na saída de Max do Sepultura, ao final daquele ano de 1996. Ele discordou da não renovação do contrato de sua esposa como empresária da banda e começaram as tretas que permanecem até hoje.
Embora a formação atual do Sepultura não dê muita importância para a data de lançamento do álbum, os irmãos Cavalera, realizaram duas turnês comemorativas: a primeira, em 2016, quando o álbum completou 20 anos e a segunda, em 2021, sendo que esta última passou pelo Brasil e os fãs lotaram todas as apresentações dos irmãos, com destaque para uma bandeira antifascista que o baterista Igor Cavalera ostentava em frente do seu kit. O fã reacionário não gosta, mas ele prova que nem todo artista é desprovido de consciência de classe.
Hoje é dia de celebrar esse belíssimo álbum que se aproxima dos 30 anos mais atual do que na própria época em que foi lançado. Se a formação clássica do Sepultura vai voltar futuramente, nós não sabemos, mas vamos manter vivo o legado maravilhoso construído por esses caras.
Roots – Sepultura
Data de lançamento – 20/02/1996
Gravadora – Roadrunner
Faixas:
01 – Roots Bloody Roots
02 – Attitude
03 – Cut-Throat
04 – Ratamahatta
05 – Breed Appart
06 – Straighthate
07 – Spit
08 – Lookaway
09 – Dusted
10 – Born Stubborn
11 – Jasco
12 – Ítsari
13 – Ambush
14 – Endangered Species
15 – Dictatorshit
16 – Procreation (of the Wicked)
17 – Symphton of The Universe
Formação:
Max Cavalera – vocal/ guitarra/ violão/ berimbau
Igor Cavalera – bateria/ percussão
Andreas Kisser – guitarra/ violão
Paulo Junior – baixo
Participações especiais:
Jonathan Davis – vocal em “Lookaway”
Mike Patton – vocal em “Lookaway”
Carlinhos Brown – percussão/ vocal
DJ Lethal – scratches em “Lookaway”
David Silveria – bateria em “Ratamahatta”
Tribo Xavante – vocal em “Ítsari”