Há 20 anos atrás, o mundo era bastante diferente: o Brasil vivia uma relativa estabilidade econômica, política e social, à exceção de um ministro da saúde que não conseguia deter um simples mosquito causador da dengue. Mas em 11 de setembro de 2001, dois fatores mudariam o mundo, um para o bem e outro para o mal.
Aqui nós iremos nos concentrar na parte boa, que foi o lançamento de “God Hates us All“, o oitavo disco de músicas inéditas lançadas pelo Slayer. Mas não podemos ignorar que a data foi a mesma que os terroristas da Al-Qaeda, capitaneados por Osama Bin Laden, escolheram para promover ataques aéreos em diversos pontos dos Estados Unidos. O Memory Remains de hoje vai tratar dos 20 anos deste arregaço de play.
O quarteto vinha do disco mais fraco de sua carreira, o tosco “Diablos in Musica“, que só impressiona pelo título, já que o som é demasiadamente moderno e completamente descaracterizado da proposta do Slayer, que é de fazer aquele Thrash Metal direto e reto, com o qual estávamos sempre acostumados.
Enquanto o mundo assistia incrédulo pela TV aos dois aviões que atingiam as torres do World Trade Center, na ilha de Manhattan, ao avião que atingiu parcialmente o Pentágono e outro avião abatido na Pensylvania, que aparentemente tinha a Casa Branca como alvo, o Slayer que havia escolhido previamente essa mesma data para lançar seu novo play, resolveu manter a programação.
Era necessária uma resposta por parte da banda, pois além de “Diablos in Musica” ter sido um fiasco, o álbum anterior era de covers. Ainda que “Undusputed Attitude” seja um álbum genial, os fãs esperavam algo que fosse no mínimo do mesmo nível que “Divine Intervention” (1994). E os caras conseguiram entregar um bom resultado.
Produzido por Matt Hyde e lançado pela “American Recordings“, o álbum em seus pouco mais de 49 minutos traz o Slayer de volta aos trilhos. “God Hates us All” fora gravado no “Warehouse Studios”, em Vancouver, Canadá, de propriedade de Brian Adams. O curioso é que este estúdio não era a opção principal, mas a banda aceitou a sugestão do produtor Matt Hyde, uma vez que era mais barato e havia uma disponibilidade maior de tempo para a banda. Após a gravação no Canadá, o aniversariante de hoje foi levado de volta aos Estados Unidos, onde fora mixado no “Larrabee East”, em Los Angeles e a masterização se deu no “Oasis Mastering”, também na California. Vamos então destrinchar cada uma das músicas.
A abertura com a intro “Darkness Of Christ” dá aquela sensação de desespero, perfeita para a pancadaria sonora das próximas três faixas: “Disciple”, “God Send Death” e “New Faith”, que trazem um Slayer raivoso, porém, ainda com influências modernas, o que pode não agradar um fã old school. São grandes faixas.
Divulgação
“Cast Down” se mostra a música mais abaixo do nível das demais, parecendo composição do álbum anterior, mas “Threshold” com um toque de groove e “Exile” devolvem ao álbum o bom nível que a ele foi concebido. Três faixas com um andamento mais “calmo” em termos de Slayer: “Seven Faces“, “Bloodline” (esta uma das melhores do disco) e “Deviance” parecem preparar o ouvinte para a pancadaria sonora que chegará depois: “War Zone“. Essa é direta e sem enrolação: Parece sobra do ‘Reign In Blood‘ versão século XXI, guardadas as proporções, é bom que se deixe bem clara essa ressalva.
Em “Here Comes The Pain“, temos a banda em seu momento talvez mais moderno em termos sonoros. Uma boa música. O disco fecha com chave de ouro, com a melhor composição da banda nos anos 2000: “Payback“. Música raivosa, rápida. Claro que eles jamais farão uma música mais rápida do que a clássica “Dittohead“, presente em “Divine Intervention“, mas esta aqui chega bem perto.
As letras, escritas em sua maioria por Kerry King, tratam de temas como religião, assassinato, vingança e auto-controle. O álbum foi bem recebido pela crítica e público, chegando a alcançar um bom desempenho em países como Alemanha e Canadá (9º lugar nas paradas), Itália (11º), Finlândia (12º) e nos EUA (28º na Billboard 200). Vendeu 51 mil cópias somente na primeira semana, nos Estados Unidos. Até 2006, as vendas somavam mais de 350 mil cópias. Foi o último álbum gravado pelo baterista Paul Bostaph, que devido a uma séria lesão sofrida no seu cotovelo, não foi capaz de terminar a turnê com seus companheiros e assim ele devolvia o posto ao membro original, Dave Lombardo. Porém, alguns anos depois, Bostaph retornaria à banda e permaneceria na banda até o seu ato final, há 2 anos atrás.
Enfim, um bom disco que trouxe o Slayer de volta às suas origens, mesmo que com toques de modernismo em seu som, afinal de contas, evoluir faz parte da nossa missão enquanto seres humanos. E um disco raivoso, lançado no mesmo dia em que um ataque de fúria em nome de “religiosos” aterrorizaram o mundo matando centenas de inocentes, e sob o título de “Deus nos Odeia”, foi uma tacada de mestre, mesmo que a banda de Tom Araya e cia. não fizesse a menor ideia de que o lançamento da obra se daria neste dia de caos.
Vinte anos depois, a banda deixou de existir, os Estados Unidos ficaram durante todo este tempo no Afeganistão, ainda lutando por conta dos ataques terroristas sofridos no dia do lançamento deste play; o Brasil piorou, tendo agora um lunático fascista, genocida e negacionista no poder, ao mesmo tempo que tenta emplacar um golpe de Estado, atentando contra a constituição. Mas esse disco não sofreu nenhum tipo de estrago neste tempo todo, segue envelhecendo bem, obrigado. Como não temos mais o Slayer para acompanhar ao vivo, nos resta celebrar este play e manter o legado dos caras.
God Hates us All – Slayer
Data de lançamento – 11/09/2001
Gravadora – American Recordings
Faixas:
01 – Darkness of Christ
02 – Disciple
03 – God Send Death
04 – New Faith
05 – Castdown
06 – Threshold
07 – Exile
08 – Seven Faces
09 – Bloodline
10 – Deviance
11 – Warzone
12 – Here Comes the Pain
13 – Payback
Formação:
Tom Araya – Vocal/Baixo
Kerry King – Guitarra
Jeff Hanneman – Guitarra
Paul Bostaph – Bateria