Em 1992, o Viper lançava seu terceiro álbum, “Evolution“, que é tema do nosso Memory Remains de hoje. Vamos contar um pouco da história deste, que é considerado por muitos, o melhor álbum da banda, mas que não foi nada fácil de ser concebido.
Depois do estrondo causado pelo álbum “Theatre of Fate“, a banda estourou no Japão, o que rendeu um contrato com uma gravadora do país do sol nascente… Porém, o Viper sofreu um duro golpe: Andre Matos resolveu deixar a banda para de dedicar a sua faculdade e eles estavam sem seu vocalista. Para completar, o baterista Guilherme Martin também resolveu deixar a banda, pois desejava voltar a morar no interior de São Paulo.
Em entrevista exclusiva que o guitarrista Felipe Machado me concedeu recentemente, ele fez uma retrospectiva da carreira do Viper e assumiu que fazer “Evolution” sem o Andre Matos no vocal foi um erro, mas ele não tinha o que fazer, uma vez que foi opção do vocalista em sair. Para resolver essa questão, eles adotaram uma solução caseira: pegaram o principal compositor da banda, Pit Passarell e o transformaram no novo vocalista. Deu tão certo que ele perdurou por mais dois álbuns, até que a banda resolveu se separar, na segunda metade dos anos 1990.
Para a bateria, eles foram ao mercado em busca de uma pessoa que pudesse ocupar a vaga. E vamos deixar o Felipe Machado contar essa história. Retiramos do press release as palavras dessa lenda do Heavy Metal nacional:
“Decidimos, por razões lógicas, que a primeira coisa era encontrar um baterista. Passamos a frequentar ainda mais shows e pedimos dicas a grandes bateristas como o Paulão, do Centúrias, e o Paulo Zinner, do Golpe de Estado. Em uma dessas noites em que nada se espera mas tudo acontece, fomos ao show da banda de rock setentista Pathe Sophismático, no Black Jack, tradicional casa de shows na Zona Sul de São Paulo. Lá vimos o baterista Renato Graccia em ação, e aquela pegada que misturava Clive Burr com Ian Paice foi decisiva para convidá-lo a entrar no Viper.”
Banda reformulada e todos foram para o estúdio, com produção de Charlie Bauerfind, que mais tarde se tornaria conhecido por trabalhos com Angra, Blind Guardian, Helloween, Hammerfall, Gamma Ray, Freedom Call, entre outros. A banda partiu para a Alemanha, onde ficou entre os meses de abril e junho daquele ano de 1992, produzindo essa pérola. O álbum tem também a participação de uma figura que viria a ser parceiro de Andre Matos: Sascha Paeth, em uma prova de que Viper e seu eterno vocalista sempre estiveram andando em paralelo. A banda deixava de ser um quinteto e atuava como um quarteto. Vamos passear por cada uma das onze faixas deste belíssimo álbum.
A abertura não poderia ser melhor, com a melódica e contagiante “Coming From the Inside“, que mostra o estreante vocalista bastante à vontade e se saindo muito bem. Até hoje é uma das minhas canções favoritas de sempre do Viper. “Evolution” vem a seguir e já traz um pouco das características que seriam abordadas no álbum posterior, o não menos sensacional “Coma Rage“. Temos um pouco de Pink Rock, mas as guitarras com palhetadas cavalgadas dão o norte por aqui.
“Rebel Maniac” a faixa número três, é um dos primeiros hits da banda na era pós-Andre Matos. A faixa bem Metal e com seu refrão grudento. Quem não sai cantando “Everybody, Everybody gets me wrong/ no one, no one, no one and nobody understands me”. Música perfeita para o fechamento dos shows da banda. Depois de três músicas em ritmo alucinado, é hora de uma canção mais cadenciada, mas nem por isso com menos qualidade: estamos falando da agradável “Dead Light“, com sua melodia e duetos de guitarra, que nos remete ao Metal britânico.
Já estamos na faixa número cinco e ela atende pelo nome de “The Shelter” e traz mais melodia ao play, onde a performance de Pit Passarell no vocal é a melhor em todo o play. “Still the Same” encerra com chave de ouro um dos melhores lados A de um disco de Metal brasileiro, com outra canção empolgante. As seis primeiras músicas passaram como um rolo compressor e a gente nem percebe que já passamos da metade do play.
Quem está no vinil, precisa virar o lado, que começa com “Wasted“, que na primeira metade tem apenas o violão acompanhando a voz de Pit Passarell, em uma breve lembrança da sonoridade que a banda fazia nos tempos de Andre Matos. Mas na segunda metade, as guitarras entram em ação e a música ganha ainda mais em qualidade. Em “Pictures of Hate“, os caras seguem apostando no Metal cru, com muito peso e espaços para inclusão de partes mais melódicas aqui e acolá.
“Dance of Madness” é uma música que poderia facilmente ser veiculada nas rádios, pelo fato de soar mais radiofônica, ainda que os caras não tenham aberto mão do peso. “The Spreading Soul” é uma balada com ótimas harmonias e boa performance de Pit Passarell. E fechando com chave de ouro, a versão para “We Will Rock You“, do Queen, que ganhou uma versão mais Punk Rock. Fechamento com chave de ouro deste que seguramente foi o melhor disco de Metal brasileiro de 1992.
Em 44 minutos de audição, temos a sensação de uma banda que evoluiu, deixou de lado os temas mais eruditos que sempre acompanham as bandas de Heavy Metal de maneira geral e investiu nas guitarras e na sonoridade mais crua. Esse foi o maior ganho da banda na época.
O título do álbum, ao mesmo tempo que foi inspirado no livro “A Teoria das Espécies“, de Charles Darwin, é descrito como a versão do livro para o momento em que o Viper passava, com a saída de dois membros da banda e eles tendo que se reinventar. Felipe Machado afirma que, guardadas as proporções, eles substituíram o Bruce Dickinson pelo Paul Di’anno, fazendo referência a efetivação de Pit nos vocais. O que parecia ser um passo atrás, na verdade foi um tiro certeiro e mostrou que a banda possuía (como ainda possui até os dias atuais) a capacidade de se recriar. E por isso eles seguem na ativa.
Após o lançamento do álbum, a banda caiu na estrada, com direito a ser banda de abertura do primeiro show do Black Sabbath em terras brasileiras, isso em 1992. Depois teve também a gravação do disco ao vivo em uma apresentação no Japão, o igualmente maravilhoso “Maniacs in Japan“, cujo setlist foi composto em sua maior parte por canções deste “Evolution“. A banda ainda se apresentou na primeira edição do Monsters of Rock brasileiro, em 1994, juntamente com Kiss, Black Sabbath, Slayer, Suicidal Tendencies, Angra, Dr. Sin e Raimundos. Aliás, recentemente foi anunciado que o festival terá uma nova edição em 2023 e fica a dica para que o Viper possa ser uma das bandas a participar.
E felizmente, após alguns hiatos, a banda segue na atividade, prestes a lançar um novo disco, “Timeless“, que está só um pouquinho atrasado, gerando ainda mais ansiedade nos fãs. Mas o mais importante é que estes jovens senhores hoje estão firmes e fortes, mantendo vivo o legado que construíram e fazendo muito barulho, hoje com o excelente Leandro Caçoilo no vocal, que tem desempenhado sua função de maneira brilhante. Desejamos longa vida ao quinteto e vamos curtir esse play no volume máximo, pois ele envelhece bem, obrigado.
Evolution – Viper
Data de lançamento – 1992
Gravadora – Estúdio Eldorado
Faixas:
01 – Coming From the Inside
02 – Evolution
03 – Rebel Maniac
04 – Dead Light
05 – The Shelter
06 – Still the Shame
07 – Wasted
08 – Pictures of Hate
09 – Dance of Madness
10 – The Spreading Soul
11 – We Will Rock You
Formação:
Pit Passarell – baixo/ vocal
Yves Passarell – guitarra
Felipe Machado – guitarra
Renato Graccia – bateria
Participações especiais:
Sascha Paeth – backing vocal
Thomas Rettke – backing vocal
Helge Engelke – cordas