Após uma reflexão grande e nada fácil, uma decisão sempre tem que ser tomada, principalmente quando está em jogo a real credibilidade Jornalismo de Espetáculos e Entretenimento. Ficar calado significa consentir com comportamentos deploráveis que vem sendo reverberados pelas redes sociais e são reflexo deste país cada vez mais polarizado em que vivemos. Precisei pontuar diferentes temas e abordar variadas situações para chegar ao panorama geral da malfadada “cena” no Brasil.
A chamada imprensa musical vai muito além dos grandes jornalões e portais. No caso do rock e do metal brasileiros, migrou dos antigos fanzines que eram produzidos em fotocopiadoras e circulavam de mão em mão entre os fãs numa era anterior à popularização da Internet para as suas versões digitais. O grande problema é que isto produziu um número sem fim de blogs e sites (mesmo os maiores) que nem sempre estão comprometidos com a informação séria. Isto criou outro problema, indivíduos que se aproveitam da situação e querem dar “carteirada” para acessar shows e eventos.
Em contrapartida, houve uma reação de organizadores de eventos e produtoras, em alguns casos de forma bem agressiva. Nunca, em tempo algum, vi algo tão degradante e humilhante quanto o tratamento atual dispensado por determinadas produtoras com relação aos credenciamentos. A presença da imprensa se tornou indesejável como alguns deles revelaram em suas próprias redes sociais. Em parte, por culpa deste “boom” de veículos variados, alguns que só atualizam suas páginas às vésperas de algum evento que querem cobrir. Isto criou uma cultura da “mendicância” por credencial.
Além disso, vale pontuar acontecimentos recentes e a forma preconceituosa com que têm sido expostas opiniões de cunho pessoal em perfis de rede sociais de empresas/produtoras que deveriam divulgar apenas informações sobre eventos e shows.
Sou defensor ferrenho das liberdades individuais e resolvi escrever este editorial sobre algo que realmente estava me incomodando. Sempre vou respeitar a opinião pessoal de alguém, mas não acho que isso deva ser bandeira para qualquer tipo de discriminação. Neste caso, um tipo de discriminação que não deveria sequer ser cogitada dentro de qualquer empresa organizadora e produtora de eventos musicais.
Qual gênero musical tem valor? Isso está restrito ao seu próprio umbigo e o universo particular de cada pessoa em sua “bolha” de preferências e visões. Este tipo de visão abre um leque de preconceito contra tudo que lutei a minha vida toda. O roqueiro tatuado seria então maconheiro, cheirador, briguento, satanista e violento?
Este é o tipo de coisa que ouvi e sofri na pele a minha vida toda, muita gente preconceituosa toma isso como verdade absoluta.
“Metaleiro não presta”, tive que suportar este tipo de afirmação em uma adolescência interiorana com pessoas de pensamento provinciano. Pior ainda quando se fala em “lixo cultural”, a coisa acaba desandando de vez. Pois para muitas pessoas o rock/metal é uma porcaria barulhenta sem sentido. Se colocar no papel de inquisidor cultural é um tremendo tiro no pé, coisa de gente imatura e sem noção de sua própria “bolha cultural”.
Ser headbanger e andar num mercado com camisetas e tatuagens profanas não é uma tarefa fácil, eu sinto os olhares inquisidores todos os dias. Ainda mais em um país de esmagadora maioria cristã e que abomina ateus e agnósticos.Tenho que ter muita personalidade e cabeça no lugar para não me importar com velhinhas horrorizadas e cristãos assustados.
Vejo uma profunda divisão e este preconceito musical até dentro do próprio rock e metal, com “especialistas de Facebook” se digladiando contra determinado subgênero como nü-metal, rock nacional, metal industrial, metalcore, hardcore, glam ou emo. Um brasileiro que curte Carnaval, sertanejo, funk, pagode ou afins não é uma pessoa inferior, apenas tem um gosto particular diferente do seu e você tem que saber respeitar.
Pouco me importa a playlist do Spotify alheio ou se ele foi a todos os bloquinhos carnavalescos da Santa Cecília ou da Faria Lima. Particularmente, eu não gosto de participar do Carnaval, mas adoro descansar na minha casa tranquilamente nos dias em que os outros estão na folia.
Neste país, onde já enfrentamos gravíssimos problemas com o racismo, a última coisa que precisamos é de mais um tipo de preconceito e segregação. Sou headbanger há mais de 30 anos, mas este não é o tipo de mundo que quero deixar para os meus filhos. Quero um mundo de respeito, empatia e de amor ao próximo.
Carla Pedra
Carlos Pupo é jornalista, fotógrafo e headbanger. Trabalhou no Grupo Estado, na agência FramePhoto e na Photo Media. Escreve eventualmente para diversas publicações e fotografa shows para agências de notícia. Atualmente coordena o site Headbangers News e trabalha na Gracenote Brasil.