Sexta-feira, 11 de janeiro de 1985. O Rio de Janeiro recebia pela primeira vez um grande festival, que começou desacreditado, mas que no final se tornou um grande sucesso, vindo a se tornar referência entre os grandes festivais de música. O primeiro artista a subir no palco foi ninguém menos que Ney Matogrosso. Mas desde quando Ney Matogrosso é artista de Rock, vai perguntar o caro leitor? Eu vos respondo com a seguinte pergunta: com que idade você descobriu que o Rock in Rio não é um festival exclusivamente de Rock?
Para os que insistem na retórica mais que equivocada, a gente te ajuda com uma pequena aula de história: na primeira edição do festival, dos 31 artistas escalados, 16 eram de artistas que não tocam Rock. Esse número pode ser maior, porque estamos considerando como Rock o Kid Abelha, por exemplo. O leitor ainda pode insistir que a única edição do Rock in Rio foi a que valeu foi esta primeira. E aí esse leitor está mais equivocado ainda, pois teve noites em que o Rock passou longe do palco, como por exemplo no sábado, dia 12, segundo dia do evento. Ivan Lins, Elba Ramalho, Gilberto Gil, Al Jarreau, James Taylor e George Benson se apresentaram.
Ainda não está convencido? A segunda edição foi igualmente equilibrada, ainda que estejamos considerando atrações como Vid & Sangue Azul, Hanói Hanói e Paulo Ricardo (aquela altura, já afastado do RPM), como Rock. A edição de 1985 teve nomes de mais impacto na cena da música pesada como Queen, Iron Maiden, Whitesnake e Ozzy Osbourne, enquanto que em 1991 tivemos Judas Priest, Megadeth, Guns N’ Roses e Faith no More, essa última, foi incluída no cast por sugestão do Guns. Vamos ficar só nas duas primeiras edições, pois nas seguintes, os artistas do Rock foram ainda em menor número.
Não há fundamentos em questionar a exclusividade do Rock no festival simplesmente porque o nome do festival é Rock in Rio. O idealizador do evento, Roberta Medina, a filha e herdeira do idealizador do festival, Roberto Medina, já explicou que o “Rock” significa coisas como atitude e empreendedorismo e não necessariamente o estilo musical que preza pelas guitarras distorcidas. Medina simplesmente escolheu o nome Rock. Ele poderia usar outros nomes como Música in Rio, Farofa in Rio ou qualquer outra coisa. O cara quis usar o termo Rock. E isso não o obriga a colocar apenas Rock em seu cast. Até porque, se ele depender do Rock em um país como o Brasil, ele vai a falência. Lembremos de que vivemos em um sistema capitalista e Medina como qualquer empresário, visa o lucro.
Enquanto os roqueiros brasileiros reclamam da “falta de Rock no Rock in Rio”, há outros festivais ao redor do mundo onde os estilos se misturam sem que haja esse questionamento raso: o Glastonbury, Summerfest, Coachella Fest, Tomorrowland, Fuji Rock Fest, Lollapalooza e Montreux Jazz Festival, este último, inclusive teve o Titãs como atração em 1988, que acabou gerando o álbum ao vivo “Go Back“. Viram? Um festival com o “Jazz” no nome, uma banda de Rock tocando e nem por isso os suíços ficaram reclamando que tinha banda de Rock em um festival de Jazz.
A pessoa que faz esse questionamento é provavelmente a mesma que vaiou Erasmo Carlos na noite do Iron Maiden em 1985, que jogou latas em Lobão ao subir ao palco depois do Sepultura em 1991 ou que vaiou Carlinhos Brown em 2001 quando este tocou na mesma noite do Guns N’ Roses. E se não estava lá nestas ocasiões, certamente gostariam de estar. Discordar da escalação destes artistas em dias “errados” não justifica usar da falta de educação. Nem tampouco exigir que Medina encha de bandas de Rock, quando o que arrasta multidões são outros nichos da música. Portanto, se você não concorda com o nome do festival, é hora de repensar seus conceitos. Eles estão pra lá de ultrapassados, pois espernear por mais Rock no festival que nunca foi 100% Rock não vai mais adiantar.