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Warrel Dane e Chuck Schuldiner: duas lendas, dois amigos que partiram no mesmo 13 de dezembro

Warrel Dane e Chuck Schuldiner: duas lendas, dois amigos que partiram no mesmo 13 de dezembro

13 de dezembro de 2020


https://youtu.be/W0Y2aj8ys50

13 de dezembro. Outra data sombria no Heavy Metal. E desta feita, marca a morte de duas grandes lendas do Heavy Metal contemporâneo. E que eram amigos: Chuck Schuldiner e Warrel Dane. O destino, sempre ele, reservou aos dois a mesma data de falecimento, separados por 15 anos. Chuck foi primeiro, em 2001. E Dane, mais recentemente, em 2017.

Nascido em. 13 de maio de 1967, Chuck era apontado por muitos como o pai do Death Metal. Começou cedo a tocar, inspirado na NWOBHM, foi um dos guitarristas mais talentosos de sua geração. Notavelmente reconhecido pela sua técnica nas seis cordas e pelas composições altamente complexas, sobretudo após o álbum Symbolic, de 1995. Sua evolução como músico o foi fazendo se afastar de fazer um sim extremo, ao ponto de ele ter fundado uma nova banda, o Control Denied. As músicas do álbum derradeiro do Death, The Sound of Perseverance, de 1998, seriam para este novo projeto, mas a gravadora forçou Chuck para que ele utilizasse o nome do Death e assim foi feito.

Desde o primeiro álbum, Scream Bloody Gore, de 1987, o Death já se mostrava uma banda diferenciada. Com um som que sofria profundas mudanças de andamento, que incluíam até mesmo partes melódicas, foi dando a sua banda o status de Cult, que é sustentada até os dias atuais e não é a toa, o cara realmente foi um revolucionário com suas mãos de ferro, comandando o Death d invariavelmente trocando praticamente todo o lineup a cada novo álbum lançado, sempre se cercando de trabalhar com músicos altamente gabaritados, como o baixista Steve DiGiorgio, os bateristas Gene Hoglan e Richard Christy, além dos guitarristas James Murphy e Andy LaRocque, por exemplo.

Os caminhos de Chuck e Dane se cruzaram no ano de 1996. Death e Nevermore excursionaram juntos e a amizade nasceu ali, apenas se fortalecendo com o passar dos anos. Warrel Dane havia sido convidado por Chuck para gravar os vocais do único disco do Control Denied, The Fragile Art of Existence, de 1999, porém Dane não pôde aceitar devido a compromissos com o Nevermore, que crescia na época com o aclamado álbum Dreaming Neon Black. Imagine você, caro leitor, como teria sido maravilhoso se ambos pudessem gravar juntos.

O destino foi implacável e levou Chuck antes mesmo que ele tivesse uma segunda oportunidade de chamar o seu amigo novamente para uma parceria: em 1999, ele descobriu um câncer no cérebro, que foi retirado com sucesso, porém, dois anos depois ele viria a falecer. O câncer voltaria, e ele que não tinha muitos recursos financeiros, não pôde fazer uma segunda cirurgia e houve uma grande comoção por parte de fãs e da imprensa, que angariaram fundos. Este dinheiro não foi o suficiente para pagar uma nova cirurgia, Chuck então passou a tomar um remédio experimental, servindo como cobaia, até que em 13 de dezembro de 2001, uma forte pneumonia tiraria a vida desta lenda.

Warrel Dane nasceu em 07 de março de 1961. Formou-se em Teologia e Sociologia, além de ser um chef de cozinha dos melhores. Dono de um vocal potente nos primeiros anos e depois mais técnico a medida em que foi envelhecendo, começou sua carreira musical na banda Serpent’s Knight, na primeira metade dos anos 1980, antes de montar o Sanctuary com seu amigo se sempre, o baixista Jim Sheppard.

E foi no Sanctuary que Dane começou a ganhar notoriedade. Os dois primeiros álbuns, Refuge Denied e Into the Mirror Black, colocaram a banda entre as melhores de Seattle, juntamente com o Metal Church e o Queensryche. Até que veio a onda do Grunge e fez com que a banda acabasse, literalmente na mão: Dane e Sheppard se negavam a fazer um som mais alternativo, como exigia a gravadora, enquanto que a outra parte da banda aceitava a imposição. Restou aos dois se juntarem ao talentoso guitarrista Jeff Loomis e iniciarem um novo projeto.

Assim nasceu o Nevermore, uma banda revolucionária, com uma sonoridade tão incrível quanto o Death, porém, com uma mistura de Thrash com Prog, de uma maneira tão única que ninguém jamais conseguiu fazer igual. O Nevermore fez mais sucesso que o Sanctuary, mas jamais chegaria ao Mainstream.

Quando a banda acabou, em 2011, Dane se viu sozinho, até que foi convencido a se juntar a quatro excelentes músicos brasileiros e resolveu tocar a sua vida, no que seria seu último projeto em vida. O que era para ser uma turnê no Brasil, ganhou o mundo, com direito a uma turnê de homenagem ao disco que mais lhe deu fama: Dead Heart in a Dead World, que completou 15 anos em 2016, foi festejado. E tocado na íntegra.

Dane alternava sua ocupação no restaurante que tinha com Jim Sheppard e sempre que tinha um tempinho de folga, voava para o Brasil e reencontrava seus novos companheiros para mais shows. A parceria deu tão certo que começaram um projeto para um disco de covers, que por sua vez, acabaria por resultar no segundo álbum solo de Dane, o sucessor de Praises to the War Machine, lançado em 2007, quando o Nevermore tirou férias longas. Concomitantemente, ele se reuniria com seus antigos parceiros do Sanctuary e gravariam The Year the Sun Died, encerrando um hiato de quase 25 anos sem lançamentos.

Mas o frontnan sofria de diabetes e não dava a mínima para a doença, o que resultou em várias baixas em hospitais. Mesmo com a saúde muito abalada, ele deu sequência a gravação do novo álbum, que ele batizou de Shadow Work. Infelizmente, na madrugada do dia 13 de dezembro de 2017, ele não resistiu a uma parada cardíaca e morreu dormindo, na cidade de São Paulo. O guitarrista Johnny Moraes certa vez me contou como aconteceu:

“Tivemos um dia de gravação e a noite eu e o Marcus Dotta (baterista) o levamos para o flat onde ele estava hospedado. Daí ele mordeu um pedaço de um sanduíche e disse que ia para o quarto, pois se sentia cansado. Depois de algum tempo eu fui lá para me despedir dele e ele não acordava. Chamei a SAMU, que até chegou rápido, mas já não adiantou, ele faleceu ali enquanto dormia.”

Jim Sheppard veio ao Brasil para cuidar dos trâmites burocráticos e fazer o traslado do corpo de volta para Seattle, onde ele foi enterrado, mas não sem antes receber as devidas homenagens. Depois de algum tempo de indecisão, tanto a Century Media quanto os músicos decidiram continuar com a produção do disco e Shadow Work foi lançado em 26 de setembro de 2018, quase um ano depois da morte de Dane. Não deu tempo de ele gravar as vozes definitivas. Foram usadas as vozes gravadas na pré-produção.

Além de músicos, amigos e de terem descansado na mesma data, ambos eram figuras preocupadas com o social, com a igualdade entre as pessoas e também críticos do cristianismo. Enquanto Chuck criticava os pastores evangélicos, na capa do icônico Spititual Healing, Dane questionava a existência de deus, inclusive cantando em Poison Godmachine a seguinte frase: “God is a word used for fear (“Deus é uma palavra usada para o medo”, em tradução livre). Todos esses adjetivos fazem dos dois figuras destacadas e notáveis no Heavy Metal moderno.

Para este redator que vos escreve, a perda de Dane foi muito sentida, ainda mais porque tive a oportunidade de conhecê-lo, em 2014, no primeiro show que ele realizou com os seus derradeiros companheiros de banda, na cidade do Rio de Janeiro. E eu tive a honra de trocar algumas palavras com ele e tenho certeza de que ele percebeu que havia um fã fervoroso dele. É até complicado separar o lado fã do lado de escritor quando me refiro à obra e ao legado de Warrel Dane. A partida de Chuck foi também sentida, uma vez que se tratava de um gênio da música extrema. Posso cravar com total certeza de que não existiu figura mais criativa na música pesada do que este frontman nascido em Long Island e radicado na Flórida, onde ele plantou a semente do Death Metal que rende frutos até hoje. Por todo o legado deixado por estas duas feras, eu vos digo: lendas não morrem.